Tarde no parque ou O que eu provavelmente perdi no Recife…

Blog   |       |    24 de fevereiro de 2010    |    2 comentários

O sábado tinha todo o sol do mundo, o que não é novidade no Recife. O parque 13 de maio tinha brinquedos, areia, patos e crianças por todo lado. Eu, que tinha acabado de ser devorada por pernilongos na exposição Memórias da Cena Pernambucana, curada pelo Leidson Ferraz, andava por ali pelo parque procurando por uma pessoa que eu não tinha idéia de como era fisicamente. Explico. Ao chegar no Recife, entrei em contato com Odília Nunes, a palhaça Bandeira, cujo trabalho encantador eu tinha conhecido no Rio de Janeiro, no Festival Esse Monte de Mulher Palhaça 2009. Odília, que não estava na terra natal, me sugeriu falar com Zaza – que ela prometeu ser “a figura mais linda do Recife” .

Bandeira

Mucurana

E lá fui eu, ver o Zaza interpretando Mucurana no parque pra quem quisesse ver. O telhado do teatro não era dourado de ouro, era azul de céu; e o lustre de cristais que combina com as óperas solenes estava substituído ali pelo sol da tarde que combina com criança brincando e se matando de dar risada livremente. E correndo. E dando palpite na apresentação. E perguntando “é o quê?”, quando Mucurana falava rápido demais. E gritando. E fugindo de medo. E voltando. E imitando o jeito esquisito de andar e fazer careta do personagem.

Com poesia singela e doce, e também cheia de crítica e propósito, o personagem conta histórias populares, histórias que são oportunidades pra que ele revele, assim, num círculo criado só praquela ocasião, sutilezas da nossa multiplicidade e sobretudo da nossa riqueza brasileira que quando foi achada por europeus já tinha muito tempo e muita intensidade de vida. Bem simples, bem direto, bem de coração. E Zaza entra e sai de Mucurana com a maior facilidade pra dizer textos que são desse Brasil-negro-pintado e outros textos que são do coração do ator que o criou.

E lá na praça no parque no Recife eu entendi de onde vem Odília e o encantamento que ela me provocou… e que a maior parte das coisas em arte são construídas em movimento, junto. O encantamento tem uma origem que não mora no indivíduo, é coletiva. E me deu até uma tristeza por não ter ido a Recife numa época em que não estivesse acontecendo o Janeiro de Grandes Espetáculos. Vai saber o tanto de trabalhos encantadores eu deixei de ver – como é o caso dos trabalhos do teatro de rua, que tem um movimento forte e unido por lá, pelo que eu soube depois – porque não entraram em cartaz durante o festival pra não competir com as peças curadas oficialmente. E pros meus curtos 12 dias, sobrou muito Recife.

'2 comentários para “Tarde no parque ou O que eu provavelmente perdi no Recife…”'
  1. Henrique disse:

    Por isso que digo, no cometário da crítica ao festival, que o janeiro não reflete o coletivo da classe teatral recifense. Muita coisa boa fica fora e muita porcaria entra. Não digo que tudo é porcaria, muita coisa boa também está no janeiro, mas é só uma parte da produção e do coletivo multicultural da nossa cidade.

  2. jobson Guimarães disse:

    Daí a necessidade de se ser independente, porque em se tratando de eventos institucionais/governamentais, os apadrinhamentos sempre ocorrerão.

O que você acha?

A Bacante é Creative Commons. Alguns direitos reservados. Movida a Wordpress.