CalÃgula
O imperador não está nu
Fotos: Henrique Araujo / CLIX
Quando terminou o espetáculo CalÃgula, para um público que em sua maioria o ovacionava, Thiago Lacerda disse, “vida longa ao Imperador e viva o Festival de Curitiba!â€. A pergunta que me pegou de jeito, quando eu voltei pro hotel, foi: quem é esse CalÃgula que Thiago Lacerda pôs em cena com direção de – ninguém menos que – Gabriel Villela?
Albert Camus escreveu CalÃgula em 1938, há sete décadas. No mesmo ano em que Hitler realizou a “noite de cristal†em que começou pra valer a barbarizar com os judeus. No ano seguinte, a França seria ocupada pelos nazistas. O recado de Camus era bem certo: havia um louco em busca do controle do mundo. Quando a peça termina (atenção, aqui tem um spoiler, prossiga se quiser, a responsabilidade é sua), após ser morto a pauladas, o imperador ergue sua face ensaguentada e diz: CalÃgula está vivo! Não é à toa que a primeira montagem seja de 1945, ano em que a Segunda Guerra Mundial termina e quando Hitler morre.
Eu não conhecia o texto de Camus. É uma peça com uma densidade polÃtica aguda. Mais que apresentar um louco babando, armadilha em que caiu a atuação de Tiago Lacerda, Camus escancara a pornografia do poder. A grande metáfora do espetáculo, ao menos pra mim, foi essa.
Agora, vem cá, CalÃgula está vivo segundo Camus, mas e segundo Lacerda/Villela, dá pra afirmar a mesma coisa? O que é que se diz com essa montagem? Vamos pensar no que seja vivacidade teatral, então. A resposta é sim, caso você acredite que vida para um espetáculo seja: a) exibição de cenas – a utilização diversificada do coro, com um grito de ópera em playback e os atores fazendo máscaras; b) virtuosismo- a pintura do corpo nu de uma mulher representando a deusa Vênus. Além de um figurino deslocado, encontrando elementos atemporais em roupas do dia-a-dia, um cenário imponente e, como diz a Bárbara Heliodora, uma “luz correta e adequada”.
Eu não posso falar por todo mundo e por mais que eu não queira cair em juÃzos de valor sem sentido, as questões que me vêm são as seguintes: um teatro vivo pra mim tem que estabelecer uma comunicação com o tempo em que se insere, tem de ir além de assimilação de elementos estéticos, tem de consorciar “o que dizer†ao “como se diz issoâ€.
Camus mostra que não havia apenas um doido de pedra controlando o mundo. Havia uma engendrada corrupção no senado. Uma conivência entre o tirado e os representantes do povo romano. O espetáculo CalÃgula surge num momento em que os escândalos no senado brasileiro estão a toda. É, ou ao menos era pra ser, o CalÃgula do perÃodo em que dobradinha Renan Calheiros/Sarney deita e rola na República de BrasÃlia. Há alguma referência ao nosso senado, igualmente pornográfico como o senado do tempo de CalÃgula? Há umazinha só, mas tão sem cheiro e sem endereço certo que se perde e até parece atirar pra lugar nenhum.
Não lembro agora, me perdoem os leitores se falho na referência, mas tenho pra mim que François Truffaut escreveu em O Prazer dos Olhos uma série de artigos sobre Orson Welles no qual ele falava sobre a categoria do “ator Reiâ€. A alusão é à peça dentro da peça de Hamlet, em que um ator interpreta um monarca. A referência é tomada de empréstimo para situar a categoria de atores que tem a dimensão cênica de interpretar um rei, nela incluso Orson Welles, que fez Macbeth no cinema e que tem uma carreira no teatro obscurecida pelo seu talento no cinema. Tanto é que Truffaut analisa alguns enquadramentos de cima pra baixo, para realçar a realeza do ator rei. Thiago Lacerda não joga nesse time do Welles, mas inaugura outra categoria, a de ator-imperador. Toda a encenação – os atores todos são mais baixos do que ele – curva-se para fazer um boquete no global. Literalmente. O espetáculo é Tiago Lacerda. Vida longa ao Imperador.
1 citação da plateia: “ele mostrou que não é só um rostinho bonito“
Ps. Sim, o Tiago Lacerda não fica nu. Tem uma pagação de peitinho, mas é de uma tiazinha lá.
PPs: Leia também a crÃtica de Marco Albuquerque.
Só vc mesmo primo pra chamar a Magali Biff de “tiazinha lá”! hauahauahau
o thiago lacerda,com essa peça,está se achando ‘o ator’……voltou a dar entrevistas malcriadas pros jornalistas,do tipo,’eu nao sou gala’,’to cagando e andando pro que pensam da peça,’dentre outras coisas….
Não acho, o Thiago Lacerda, um bom ator.
No teatro é um cumulu do absurdo….
Asisti ontem à peça CalÃgula , e , para mim , foi perfeita ! Faço um curso de teatro, e este ano estudo Brecht , aà , que foi mais maravilhoso ainda, pois o espetáculo é inteiramente Brestiano … A interpretação dos atores é suprema …todos ! E a simplicidade , educação e o carisma , pois pude conversar com todos do elenco , inclusive com o Thiago , falar sobre a peça , enfim, isso é um pouco raro, pois ultimamente, falo de Ribeirão Preto, todos que lá estão se apresentando , não estão recebendo ninguém…estão simplesmente indo embora …. então …foi realmente um dia muito bom para mim ….valeu CalÃgula!!!
pô, Ronaldo,
q bom q o CalÃgula recebeu vcs,
então.
E ruim qdo não se recebe, né?
Mesmo que ir em sessão
de macumba e o santo não baixar,
rolar um problema de conexão.
Mas, sério.
Cê tá estudando Brecht?
Bacana, então, vc deve estar ligado no contexto histórico
em que a dramaturgia e a proposta dele tá inserida,
q não é um mero jogo de assimilação de elementos,
o teatro épico tem, claramente, um programa, um marcar de posição contra a burguesia…
ih to falando demais, e talvez chovendo no molhado,
até pq tu tá estudando o cara, então.
E por falar em ser ou não ser brechtiano,
outro dia eu tava assistindo no Fantástico aquele quadro do Evandro Mesquita e da Fernanda Torres, o Bicho Homem.
Pô, e não q os caras tão são brechtianos?
Engraçado, como o capitalismo é foda.
Consegue assimilar e transformar em produto
até aquilo que, em determinado momento, se voltou contra si próprio. Não vê os hippies, como movimento, cuja estética
foi assimilada pelos caras. O mercado é foda.
Mas esse papo tá chato,
e aÃ, como foi o papo com os caras?
O Tiagão deve ter até aceitado tirar foto contigo
e tu, todo pimpão, deve ter até criado um álbum novo no orkut: “eu e o Tiago Lacerda”, ou “eu e o elenco de CalÃgula, tô podendo!!!!”.
Na boa, abração e que bom q vc curtiu a peça, q ela falou pra vc, isso é o q é mais importante e merda pra vc no curso.
correção:
“Fernanda Torres, o Bicho Homem.
Pô, e não [é] q os caras [s]ão [t]ão brechtianos?
Olha, estou me perguntando até agora, dez meses depois que via a peça, que diabos é aquela boca aberta do Thiago Lacerda? Ele não decepcionou, mas não é nada genial. Aliás, aquela história de colocar a mão na boca aberta toda hora é uma muleta sem nenhum sentido. Na infância me acostumei a visitar manicômios, onde tinha um tio internado. Nenhum dos doentes ficava chupando os dedos com a boca aberta. Certeza!
– e o q diabos é aquela musiquinha da Piaf no final
– o que é aquela saudação à la hay Hitler dizendo “CalÃgula está vivo!”
– é o que é aquele ator gordinho com rosto pintado de verde fazendo brincadeirinhas pra chamar atenção.
***
Ô sea… também tenho, ainda, perguntas.
Simplesmente FANTÃSTICA a interpretação do Thiago Lacerda. Me surpreendeu e muito. Ele é uma mistura do CalÃgula, Hitler e o Coringa. Muito bom!!!
Achei a atuação fraca: a mistura de texto declamado, antes que atuado, antinaturalismo e elementos circenses tornados pós-modernos acabam não constituindo a peça: boa parte das coisas aparece como gratuita. A única coisa que de fato é soberba é o texto, e quase tudo: vozes, atuações, cenografia, figurino, luz não agregam valor, ao contrário. Boa tentativa, resultado aquém…
Adorei o seu comentário!!! Fui assistir ontem a peça que está em cartaz no RJ, foi exatamente o que senti, ai que bom ter este espaço de discussão! Porque todos os que foram comigo acharam a peça o máximo, menos eu, que já conhecia o texto de Camus e sabia das implicações históricas, filosóficas e polÃticas do drama. É interessante notar que o global da vez, Thiago Lacerda fez esta montagem agora, em 2010 e que, em 1990, o global Edson Celulari, representou o mesmo personagem, mas tenho impressão que pela polêmica que causou deva ter sido uma peça com muito mais conteúdo polÃtico e imaginativo. Vc tem alguma informação sobre esta montagem?
É um plágio barato de Heath Ledger com profundidade de um chafariz de praça.