Greta Garbo Quem Diria…

Críticas   |       |    17 de janeiro de 2010    |    1 comentários

Picadinho de frango no cais da piedade

Fotos: Rodrigo Moreira

Informações sobre as peças do Janeiro dos Grandes Espetáculos? Não, nenhuma. Só algumas indicações nas sinopses do programa e vamos que vamos. Primeira peça que eu vi foi Greta Garbo Quem Diria… eu estava crente que se tratava de uma produção 100% made in PE, o que notei devido a uma série de piadinhas locais tipo “vou pegar aquele frango fazer picadinho dele e jogar no sopão da caridade no Cais de Santa Rita” ou ainda risos desenfreados  que pediam uma senha local para se entender a graça, tais como “eu estava por ali na Conde da Boa Vista”.

E vamos ao São Google, depois de terminada a peça, graças a ele, descobrir que o texto é de um pernambucano, Fernando Mello, que a peça teve uma montagem no Rio de Janeiro, na década de 1970 com Mário Gomes.  Quando eu conversava com um amigo sobre o fato desta peça ratificar estereótipos sobre o homossexual e sobre uma pessoa que vem do interior, ele me lembrou que há quase 40 anos, quando a peça foi montada o texto chegou a ser proibido, “imagina, mostrar dois gays em cena, naquele tempo”.

Mas e hoje? O que se pretende dizer com uma dramaturgia apresenta um enfermeiro, Pedro ou Pedroca, meia idade, gay, como uma espécie de bobo da corte, repleto de trejeitos e piadinhas que não ultrapassam a barreira do lugar comum – “me ofender aqui na minha Maison?”, “eu? Eu sou uma balzaca”,  o tipo de brincadeirinha reacionária e acrítica que a gente já viu aqui e  acolá. O que dizer de uma dramaturgia que apresenta um menino, Renato ou “Renato meu beemm”, vindo de Cabrobó, um estudante que se envolve com prostituta – sem desconfiar que seja, como diz a sinopse no site do festival “uma moça de vida bem duvidosa”– em torno de quem paira uma certa inocência, própria do interior, com expressões do tipo  “Cadê aquela sua pureza?”

Lembrei de uma entrevista do Bob Dylan. Ele não canta os seus clássicos em shows reproduzindo a versão dos discos. Sempre cantou diferente. sobre isso, Dylan falou que que não podia repetir do mesmo jeito, hoje,uma letra escrita há dez, 20 anos. Em Greta Garbo… esse retrato que é revelado em cena, do mocinho do interior puro e da bicha velha solitária se deixando enganar, faz que tipo de conexão com os problemas de hoje, com as questões relativas à homossexualidade e a migracao hoje em dia? Ignorar isso é o mesmo que repetir, riff por riff, a mesma gravação de um disco velho, arranhado, de uma música que pode até agradar, por que todo mundo conhece e canta junto: a do preconceito, a dos lugares comuns.

5 cervejas que poderiam ser compradas com o dinheiro do ingresso

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Outros textos sobre o 16º Janeiro de (Super-Mega-Hiper) Grandes Espetáculos na Bacante:

Meu, que não estava no festival, mas estava no contexto da cobertura

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Encruzilhada Hamlet

Começar a Terminar

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A Dona da História

Prêmio APACEPE de Teatro e Dança

'1 comentário para “Greta Garbo Quem Diria…”'
  1. Rodolfo Lima disse:

    É por essas e outras que sou seu amigo.
    🙂

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