A culpa é da ciência?

Críticas   |       |    8 de julho de 2008    |    5 comentários

Uma crítica experimental

Foto: Zuza Blanc

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10 anos que ainda são 9.
auditório de uma universidade: escolha feliz pra questionar a ciência.
citações de filmes adequadas ao conteúdo ,mas algumas delas na hora errada. quando aparecem o Neo e o Morfeu logo no começo, sem contexto nenhum, quase achei que fosse ver a versão teatral de Matrix.
figurinos que tiram as formas dos corpos dos atores.
cenário cheio de parafernálias, com homenagem tímida ao Duchamp que não vira cena.
músicas por vezes incompreensíveis, por vezes didáticas, por vezes clichês. algumas vezes só ruídos.
piadas das quais ninguém ri. momentos sérios extremamente cômicos.
uma peça com cota para afro-brasileiros e para comemoração dos cem anos da imigração japonesa.
um personagem que apresenta questões filosóficas tomando uma coca-cola. idéias que, por vezes, são como pontadas que nos fazem acordar, outras vezes, não se concretizam em cena.
atores não parecem preparados pra saborear o texto, que inclusive às vezes não se apresenta saboreável.
ao mesmo tempo em que os corpos parecem despreparados, também parecem paradoxalmente preparados por serem quase como máquinas.
curioso notar como as cenas que criticam (portanto colocam em crise) a ciência, também colocam em crise a sociedade de consumo.
aparece muito mais a relação econômica por trás do motor da ciência do que a ciência em si.
vende-se célula-tronco. vendem-se fetos. vendem-se partes do corpo sob encomenda no atacado. vende-se alma, mesmo que esteja fora de moda. aliás, fora de moda é vilão falando espanhol.
solução extremamente simples a de colocar pesquisas “opostas” de universidades. demonstra a lógica de competitividade e a conseqüente incomunicabilidade entre pesquisadores.
roubam no jogo ao colocarem atores falando diretamente com o público. não funciona. tudo seria mais intenso se virasse cena.
roubam de novo quando dão destaque apenas a uma visão de assuntos polêmicos como transgênicos e aborto.
o que parece uma obra inacabada para o grupo pode ser considerado um avanço em direção da busca de estéticas teatrais diversas do naturalismo encontrado em Einstein e Copenhagen.
assisti essas duas montagens na época de colegial, em que não havia estudado naturalismo nem na literatura. e me bastavam àquela época. linguagem e estética é uma questão temporal, mas também uma de percepção.
gosto de pensar que peças assim ainda ganham o fomento.
mas também não precisa escrever no programa que está dando um salto sem rede. essa é velha.

2 frases excepcionais da dramaturgia

'5 comentários para “A culpa é da ciência?”'
  1. Oswaldo Mendes disse:

    Uma crítica, seja experimental ou não, é sempre bem-vinda. Cante loas ou derrame fel. O fazer teatro, ao longo de cinco décadas, contando o período escolar é verdade, me ensinou principalmente a ver e ouvir serenamente. Sem serenidade, nada se vê, nada se ouve e, assim, nada se aprende. Portanto, bem-vindas as opiniões do Fabrício. Elas são úteis, como pontos de reflexão, seja no elogio, seja no reparo. Exceto quando comete imprecisões. Onde ele viu cota para afro-brasileiros e comemoração dos 100 anos da imigração japonesa? Certamente nao foi no espetáculo a que se refere. Ver naturalismo em “Copenhagen”, só na sua lembrança de colegial. E como foi para o pantanoso terreno formal, da estética, ele não precisava dispensar as maiúsculas no início dos períodos, para afirmar o seu estilo. Isso, de tão velho, está em desuso desde a minha distante juventude. No mais, é agradecer a contribuição da sua crítica experimental a um trabalho de criação coletiva, igualmente experimental. Em agosto, mais três espetáculos do Arte Ciência o esperam, Fabrício. Caso queria ver ou rever, seu olhar crítico será sempre recebido como um estímulo. Por ora, fica o abraço fraterno, ainda que virtual.

  2. Olá Oswaldo

    Valeu por entrar na fogueira. Não são todos que o fazem.
    Considere efetivamente só o que valer a pena. Ressalto, como já fiz em muitos comentários da Bacante, que somos pela piada, antes do julgamento. E nessa categoria se enquadra o comentário sobre cotas para afro-descendentes e nipo-brasileiros. Recuso-me a explicá-la e espero que a peça seja vista, pra que faça sentido.
    Lembro de muita coisa de Copenhagen, porque na época pirava em física quântica. Até onde me lembro era um diálogo que tendia ao naturalismo. Mas vc, que faz parte do grupo, deve lembrar melhor que eu. Certamente é uma peça que gostaria de rever, à luz de alguns anos de vida que se passaram.
    Sobre a dispensa das maiúsculas e afirmação de um estilo, peço que você navegue por aqui e verá que não é afirmação de qualquer estilo. Tão somente a radicalização da proposta irônica da crítica “experimental” (existe crítica efetiva, daquelas que colocam em crise, que não seja experimental?).
    Verei as três novas peças, bem como veria as do repertório se estivessem em cartaz.
    Se posso te jogar um novo tema para o diálogo, gostaria que você discutisse a relação avanços da sociedade de consumo e avanços da ciência, parte do espetáculo.
    Apareça e obrigado pelo comentário.
    Abraço.

  3. Valmir disse:

    Oswaldo = Patrícia Aguille [2]?

    Fabrício, voto pelo “Semana das Críticas Experimentais”, hummmm?

  4. Fabrício disse:

    Só responderei o seu comentário em juízo.
    Abraço.

  5. […] No FIT 2009, será possível conferir Crónica de José Agarrotado, que esteve em cartaz no SESC Santana em 2008. Rainh[(a)]s – duas atrizes em busca de um coração é a “peça de festival” desse ano – depois da temporada no SESC Avenida Paulista, a montagem já foi pra Curitiba, São Luís, São Caetano entre outros lugares e agora será apresentada no FIT. Na rua, a programação é mais curta, mas entre as montagens você confere Das saborosas aventuras de Dom Quixote de la Mancha e seu escudeiro Sancho Pança – Um capítulo que poderia ter sido que esteve no início de 2008 em Uberlândia e, no módulo Aldeia FIT, mais um trabalho do grupo Forrobodó (É poesia popular), que também se apresentou no festival no ano passado com o Pavão Misterioso. O grupo Arte e Ciência no Palco apresentará dois trabalhos (Einstein e After Darwin), nenhum deles criticados pela Bacante, mas você pode conferir as críticas dos trabalhos mais recentes: A Dança do Universo e A Culpa é da ciência?. […]

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