A Mandrágora

Críticas   |       |    11 de março de 2008    |    1 comentários

Tapa na Moral e nos Bons Costumes

Foto: Divulgação

 

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Uma das platéias com mais, digamos assim, representantes “da classe” (tipassim, aquele povo que faz teatro, é amigo de quem faz teatro ou simplesmente é artista), estava presente para assistir A Mandrágora, durante o I Festival Ibero-Americano de Teatro de São Paulo. O motivo da lotação do auditório Simón Bolívar provavelmente foi prestigiar o grupo Tapa, que possui um pouco menos de 30 anos, e já havia ficado em cartaz por muito tempo com essa mesma peça.

O texto de Nicolau Maquiavel (é, aquele mesmo), escrito em 1503, traz uma crítica à ganância, à instituição familiar e à Igreja, por meio de uma comédia leve sobre os interesses humanos. Na história, o jovem Calímaco passa a desejar ardentemente a virtuosa Lucrécia, mulher incapaz de engravidar de seu marido, um homem mais velho.  Com a ajuda de um ganancioso rapaz, um ambicioso frei e a não menos dissimulada mãe da moça, Calímaco se finge de médico e convence o marido de que a solução para a infertilidade de Lucrécia é uma poção de mandrágora, apenas para passar uma noite com a moça e conquistá-la. A ironia do texto de Maquiavel está no fato de que Calímaco, teoricamente, manipula os outros personagens para conseguir o que deseja, porém, os outros se deixam manipular por suas próprias ambições – seja ter um filho, seja ganhar dinheiro. 

 

A direção fica por conta de Eduardo Tolentino, em uma montagem bem menos realista do que outras produções do Tapa, como A Moratória, também dirigida por ele, em cartaz no SESC Consolação. Em A Mandrágora, eles optam por uma abordagem mais lúdica, em que os atores ficam o tempo inteiro no palco, mesmo quando não estão de fato na cena – às vezes fazem algumas brincadeirinhas, como reagir com gestos e expressões a situações ou citações ao seu personagem durante as cenas. Também conseguem achar boas sacadas, como por exemplo, transformar uma mesa com a tampa virada para a platéia e com dois atores sentados em cadeiras nas laterias produzindo o som de cavalos, em uma carruagem.

 

Os atores, além de trazer um bom desempenho individual, apresentam principalmente um jogo alinhado e bem entrosado entre eles, deixando divertidas até mesmo as cenas em que eles apenas se entreolham. Destaque para o personagem do marido, aqui interpretado por Guilherme Sant’Anna, que ganha a platéia (inclusive quem vos escreve) com seus trejeitos afetados e com as falas ignorantes de seu personagem, mesmo apresentando um humor mais pastelão.

 Em vários momentos a montagem apela pra um excesso de explicação, como quando o frei explica aos espectadores que não sabe se foi ele quem enganou Calímaco ao receber uma grande quantia de dinheiro por ajudá-lo a ficar com a moça ou foi enganado, quando o público acabou de assistir a cena em questão e pôde concluir isso sozinho. Ou mesmo no final, quando após aplausos (as platéias de São Paulo estão meio apressadinhas ultimamente… nem esperam a peça acabar, e já estão às palmas), ainda foi dada uma “moral da história”. Também aparece em excesso no espetáculo, os signos para representar objetos fálicos na hora de brincar com o desejo sexual do protagonista – assim, os personagens são vistos esfregando garrafa, copo, chave, pilão (não o café… aquele negócio de moer grãos mesmo) – ou seja, tudo que é mais compridinho e rolicinho. Tá certo que o moço tava necessitado, mas oquei, já entendemos a brincadeira.  

O grupo Tapa consegue aqui trazer uma comédia leve e despretensiosa, de maneira lúdica e pouco realista, ao mesmo tempo em que promove uma crítica aos interesses pessoais, que colocam ambições acima da vida dos outros. Por mais que o texto tenha mais de 500 anos, ainda permanece atual e maquiavélico (ual, aposto que estavam esperando esse trocadilho o texto inteiro, hein?).

4.777 representantes “da classe” na platéia

'1 comentário para “A Mandrágora”'
  1. Silvia Helena Duchini disse:

    Assisti a peça teatral : A Mandrágora e amei.
    Fomos num grupo de 44 pessoas da UFMS
    e foi um consenso:
    A peça é muito boa.
    beijos.

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