Cachorro Morto

Críticas   |       |    24 de junho de 2008    |    8 comentários

Uma peça que assisti

Fotos: Maíra Soares

cao_morto110.jpg

Cheguei às dezenove horas e quarenta e dois minutos na Unidade Provisória Sesc Avenida Paulista, que fica na Avenida Paulista – o que não quer dizer muita coisa, o nome, quero dizer, porque o Sesc Pompéia, por exemplo, não fica na Av. Pompéia, fica na Rua Clélia. Pra ser mais exato, o lugar onde vi essa peça fica no número 119, no bairro dos Jardins, na cidade e no estado de São Paulo, Brasil, América do Sul, Hemisfério Sul, Ocidente, Planeta Terra, Via Láctea.

cao_morto003.jpg

Desculpe se eu estou mudando de assunto, mas o Sesc, que é o Serviço Social do Comércio, tem um grande número de projetos culturais, artísticos, sociais, esportivos, e a maioria deles é de graça ou muito barata – como essa peça que eu fui ver nesse dia e que começava às vinte horas na Unidade Provisória Sesc Avenida Paulista, e que só custava 2 reais. Eu fui ver essa peça porque eu gosto de peças e porque eu tinha lido o livro que inspira a obra, mas que na verdade não é só inspirada no livro, é praticamente uma adaptação.

Desculpe se eu estou mudando de assunto, mas inspiração é quando você vê uma coisa e quer contar pra mais gente, então você junta essa coisa com mais um monte de coisas que você viu e faz outra coisa diferente pra contar o que você sentiu quando viu todas essas coisas. É por isso que eu estou dizendo que a peça que eu vi na Unidade Provisória Sesc Paulista não foi inspirada no livro O Estranho Caso do Cachorro Morto que foi escrito pelo Mark Haddon, mas foi uma adaptação, porque adaptação é quando você vê uma coisa contada de um jeito que você gosta e quer contar também, mas aí você conta de um jeito um pouco diferente mas na verdade conta a mesma coisa que você ouviu ou leu.

cao_morto035.jpg

Além disso, eu também vi a peça que é uma adaptação do livro do Mark Haddon pra escrever essa crítica aqui. Na verdade, a gente não deve ver peças pra escrever sobre elas, a gente só deve escrever a crítica quando a gente leva com a gente alguma coisa da peça e quer conversar sobre isso. Como um monte de coisas vieram comigo da peça, resolvi escrever sobre essa peça assim tentando reproduzir a maneira como os personagens da peça falam seguindo uma lógica matemática que permite poucas abstrações.

Desculpe se eu estou mudando de assunto mas essa peça faz parte de um projeto que o Sesc, que é o Serviço Social do Comércio, chama de Primeiro Sinal. Primeiro Sinal é um nome complicado de entender porque é o que as pessoas chamam de ambigüidade, pois ao mesmo tempo lembra os três sinais que tocam no teatro pra você ficar quieto e saber que a peça vai começar e lembra também a idéia de que é o primeiro projeto daquele diretor ou grupo. Diretor é a pessoa que decide como vai contar a história e que às vezes chora no final da estréia.

No caso dessa peça, eles tentaram complicar as coisas e colocaram cinco pessoas pra interpretar o mesmo personagem. Eu notei logo no início que o personagem era o mesmo, sem que ninguém tivesse me explicado, porque eu tinha lido o livro. Todos tinham nomes diferentes, como se o personagem estivesse em cada um de nós, que assistimos. E sei que é difícil de compreender. Mas isso é uma coisa que eu senti, e sentir é uma coisa complicada que eu não vou tentar explicar.

cao_morto186.jpg

O cenário era cheio de papéis amarelos, desses que a gente encontra nos escritórios e que as pessoas chamam de postits, que na verdade é um nome americano que quer dizer guarde isso, ou lembre disso. O diretor me explicou depois que na verdade isso ele viu numa das intituições que ele visitou como terapia de algumas das crianças com Síndrome de Asperger, que é a síndrome do personagem principal. Gostei que ele me explicou isso porque tem uma cena que eles usam o postit, mas me disseram que não posso contar, então não vou.

Tinha também uma tela branca no chão onde se projetavam números e imagens. Algumas imagens não faziam sentido nenhum, como aquela que mostra um cachorro sendo formado por números. Não acho que o personagem pensa no cachorro como números. Outras imagens eram exatamente o que eu esperava, como por exemplo o carro amarelo que aparecia quando o personagem falava do carro amarelo. Gosto quando as coisas ficam com um significado só.

Eu nunca tinha imaginado que todos os outros personagens do livro também tinham saído do hospício. Eu conheço um hospício. Talvez eles sejam a maneira como o menino vê os outros personagens, talvez seja uma maneira de mostrar que todo mundo poderia estar num hospício. O que seria algo legal, porque deixaria de ser um hospício. Ou o mundo viraria um hospício. Não gosto de pensar em todas as coisas que ainda não aconteceram.

cao_morto102.jpg

Não acho que tem mais nada pra comentar.

Fim

5 diálogos do livro que não estavam na peça. Eu me lembro.

'8 comentários para “Cachorro Morto”'
  1. Sebastião Braga disse:

    Assisti essa peça hoje (26/06) e procurei no google para ver se tinha site, acabei caindo aqui. Só queria dizer (sem imitar o jeito do personagem falar e pensar) que eu achei muito muito bacana. Recomendo muito. Achei a dinâmica muito interessantem, além da temática ter sido contanda com uma sutileza invejável. Adorei. É bem provável que eu volte e leve mais pessoas.

  2. byanca disse:

    a peça é fantastica , também recomendo ! muito muito muito !

  3. […] – Cachorro Morto/ Bate-papo – Uma trajetória em direção ao “outro” ou o desejo de entender o mundo. […]

  4. Rosi Braz disse:

    Assisti essa peça no começo do ano e fiquei apaixona, tanto pelos personagens quanto pela história que é de uma sensibilidade impar… Amei quero ver de novo, já indiquei a vários amigos… Pena que saiu de cartaz.

  5. amentira disse:

    estou pretendendo assistir esse comentado espetáculo e acabei lendo a critica e fui pesquisar agora sobre o livro e sabe o que eu achei? que o espetaculo foi premiado essa semana como melhor texto original em um festival do parana.

  6. Stella disse:

    onde mais e quando vcs se apresentarão?

  7. Galdino disse:

    A peça é muito boa fui assistir dia 21/09 com a escola Padre Antão e gostei muito se tiver oportunidade de assistir vai que é muito boa

  8. Isabela disse:

    Eu assisti! Eu adorei! Eu chorei!
    Chorei muito. Uma peça bem trabalhada levando o público a pensar e reagir da forma que lhe cabe o conhecimento. Tenho 17 anos, amo assistir peças, e gostaria de rever essa. Eu tenho contato com pessoas com certos problemas relacionados ao Altismo, então pra mim foi simplesmente lindo, triste e envolvente. A música de fundo, é muuito boa. A escolha da trilha sonora me emocionou muito mais. Um viva a Arte!!!

O que você acha?

A Bacante é Creative Commons. Alguns direitos reservados. Movida a Wordpress.