Chala̤a РA Pe̤a

Críticas   |       |    2 de julho de 2007    |    8 comentários

Uma única cena

Foto: Lenise Pinheiro
Foto desfocada: www.chalacaapeca.blogspot.com

“Engenho Mostra Um Pouco do que Gosta” é o nome da terceira mostra organizada pelo Grupo Engenho de Teatro, que acontece ao lado do metrô Carrão, Zona Leste de São Paulo, até 12 de agosto. Estão lá os fomentados Auto da Paixão e da Alegria, da Fraternal Cia. de Artes e Malas-Artes; Nonada, da Cia. do Feijão; A Mãe, do Núcleo 2 do Teatro Fábrica; e Chalaça – A Peça, da Cia. Les Commediens Tropicales. Esta última eu assisti no domingo passado, com casa cheia e nada do público dos teatros centrais.

Chalaça é a adaptação livre do romance O Chalaça de José Roberto Torero e é dirigida por Marcio Aurelio, premiado diretor que tem no currículo a preciosa montagem de Agreste. O personagem central, Francisco Gomes Chalaça, que não aparece na montagem, cumpriu o patético papel histórico de braço direito de D. Pedro I.

A idéia da Companhia Les Commediens Tropicales é reler a história desse Brasil colonial de forma a estabelecer paralelos com os escândalos tão corriqueiros na política brasileira atual. Mas como o inferno está cheio de boas intenções, mais uma vez encontramos uma deficiência na linguagem do espetáculo que valeria boas palmadas na bunda do premiado diretor supracitado. E bunda de fora não faltou.

Sintomaticamente o grupo de ex-alunos da Unicamp se apresentou na Mostra de Teatro de Americana e não ganhou nenhuma premiação. A razão disso pode ser explicada quando lemos algumas declarações do ator Carlos Canhameiro: “Queremos eliminar o exagero. A pesquisa do grupo caminha justamente nesse sentido: nos perguntamos o que é e o que não é importante no palco”. Na dúvida do que é ou não essencial, sobraram os atores, um microfone, muitas cadeiras e três telas de vídeo. Faltaram cenas.

A escolha de recriar a obra por meio de depoimentos fica esvaziada en função das possibilidades de cena que são sugeridas pelo texto, mas que não são radicalizadas no palco. Inclusive, a própria linguagem dos discursos perde muito em significação quando o microfone é utilizado, estático, na frente do ator, servindo somente para limitar movimentos e ampliar a voz, algo em torno de metade do tempo do espetáculo. Nesses momentos fica um ator no centro fazendo das tripas coração pra tentar preencher o espaço do palco somente através do seu discurso verbal. O corpo dos atores fala muito pouco e vemos um grande potencial desperdiçado.

A tal dança das cadeiras do poder parece quase nada para preencher o que resta. O vídeo sugere a temática das TVs Senado, Câmara e outras, mas só sugere mesmo, não chega a servir efetivamente como linguagem. O público sofre a ironia dos que estão no palco na cena da pausa para o cafezinho. Quem precisava de café naquela altura do espetáculo era eu. Fica, apesar de tudo, a imagem da única cena bem resolvida da montagem, com escatologia brutal (e mal contextualizada), que representa bem os tipos de acordos que os grandes políticos da nossa história selam.

A mostra continua. Semana que vem tem Brecht. Pra quem está na Zona Leste é uma aposta escolher algum dos espetáculos. Uma aposta barata, devo dizer: os espetáculos são de graça. Mas sempre existe algum risco, que eu vou continuar correndo.

6 desertores ao longo do espetáculo

'8 comentários para “Chalaça – A Peça”'
  1. Cia. LCT disse:

    Olá… Depois dá um pulo no blogui da peça, acho q vc se equivoca em algumas informações!
    E apareça no nosso novo espetáculo e depois tome um café conosco.
    Há braços.

  2. Fabrício Muriana disse:

    Opa.
    O bom dos comentários é que não tem que esperar até o dia seguinte pra entrar na coluna “erramos”. Gostaria de saber onde errei. Quanto ao café, posso tomar sim, é só marcar.
    Qqer dúvida: fabricio@bacante.com.br

  3. Cia. LCT disse:

    Well… Para n�o estender muito o assunto. Em Americana, q n�o � uma mostra e sim um Festival, ganhamos o pr�mio de melhor atriz, al�m de v�rias indica�es… E tb participamos do Festival de Resende e l� ganhamos… Mas, o dia q premia�o indicar alguma coisa, David Lynch estar� fodido!
    E… Uma coisa ser sintom�tica porque teoricamente passamos em branco num Festival de Teatro � quase comparar Alhos com Bugalhos…! E… Sintomaticamente a qu�?
    E… Pegar uma frase de um ator dada num contexto e us�-la para explicar raz�es outras � como diria o editor da Prov�ncia do Par� copiar release mal.
    O personagem central � Francisco Gomes da Silva, emin�ncia parda com alcunha de CHALA�A. E, pat�tico papel hist�rico de bra�o direito de D. Pedro I, � por sua conta e risco!
    Ah… Achamos q o papo ficaria melhor num caf�. Que, pelo visto, s� voc� queria durante o espet�culo, uma vez q a recep�o por parte do p�blico nos pareceu bem mais empolgante do q a sua (o q n�o � nenhum problema, apenas, talvez, um pouco injusto julgar a recep�o de todos a partir do teu microcosmo!).
    Enfim… S� mais um ponto, o quinto par�grafo � o mais emblem�tico do discurso vazio e absolutamente contradit�rio. Se optamos por uma cena em forma de depoimentos, que � a radicaliza�o da proposta, como pode essa mesma cena ser esvaziada de possibilidades presentes no texto que foi constru�do para uma cena narrativa? Acho q um papo com a proposta e n�o um achismo pernicioso dos dias atuais seria mais salutar.
    Mas… Como sempre, a recep�o � de cada um…!
    H� bra�os.

  4. Fabrício Muriana disse:

    Gostei da comparação humilde com o David Lynch, define bem o que você (autor que se esconde atrás do nick Cia LCT) entende por alhos e bugalhos. Acho que realmente os festivais servem mais de vitrine do que para premiar algum mérito de montagens. Ponho o rabo entre as pernas e me desculpo por ter deixado passar a premiação que a atriz Paula Mirhan dividiu com Andréia Nhur no Festival, e não na mostra, de Americana. E sintomática, pra mim, é a quantidade de indicações desproporcional à quantidade de prêmios num festival com tão poucos grupos. Mas isso já não importa mais, afinal o festivais são só vitrines, como supracitado.
    O comentário recontextualizado agora tem link para que nossos parcos leitores se deleitem com a multiplicidade de vozes sobre a mesma peça. No caso, a de vocês.
    Daquilo que é de minha conta e risco, somo que é tudo, não só a afirmação sobre o Chalaça. A intenção de escrever sobre a peça de vocês é também de minha conta e risco. Inclusive a intenção de ir assistir a peça de vocês também é de minha conta e risco.
    Quanto à recepção que tenho a partir do meu microcosmo, considero restrita, e por isso está descrita aqui, não procurando só recepção, mas na procura de diálogo. Não só meu com vocês, mas com quem mais quiser participar. O que posso afirmar sem medo, é que nesse diálogo que proponho com a crítica, entro da forma mais honesta, sem rodeios nem frescuras.
    Quanto ao quinto parágrafo, aquele do discurso vazio e absolutamente contraditório, não vejo a obra inicial de Torero como um texto meramente narrativo. E mesmo que a adaptação tendesse para esse caminho, não considero que a forma que vocês encontraram se aproxima de qualquer radicalização. Ou seja, no pêndulo que balança para o excesso e para a falta de sentidos no momento da construção do espetáculo, pesou mais para a falta. Isso visto do meu restrito microcosmo. Garanto que aqui não há achismo na minha opinião.
    Por fim, concluo que sim, “a recepção é de cada um”, mas que definir um espetáculo pelo que a platéia recebe, parece-me bem menos relevante do que pautar o mesmo espetáculo pelo diálogo com a platéia. Sobretudo quando a companhia tem ferramental para continuar o diálogo através do blog, videos no youtube e por todas as ferramentas da internet. Mas isso também vai de cada um estar aberto a esta experiência.

  5. quina vida disse:

    Colocar número de “desertores” do espetáculo é uma atitude muito infeliz de sua parte. É aí que se balisa a criação artística? Coitado do Ionesco, que depois de 2 semanas com o espetáculo “A Cantora Careca”, teve que fechar a temporada por falta de público. se ele fosse se balisar por isso, e pior, se a gente fosse se balisar por isso, teríamos perdido uma coisa muito boa, não acha?

    vamos agora balisar os espetáculos pelas platéias eufóricas e saídas antes do horário? tá bom então:

    então parabéns aos nosssos bbb’s em produções e também espetáculos para pais em finais de curso de teatro. palmas não faltam para esses, te garanto.

  6. Anonymous disse:

    Oi querido Quina.
    A escolha da cotação é arbitrária e normalmente está relacionada com algum aspecto mais engraçado do espetáculo. Sabemos que cotação, via de regra, não serve pra nada. Se vc entrar no portal da Veja São Paulo, vai ver que na home existe uma lista das peças mais indicadas, através de cotação. Por aí já concluímos muita coisa.
    No nosso caso aqui serve como mais um comentário da peça. No caso de Chalaça, usei como mais uma informação sobre o dia em que vi o espetçaculo. Particularmente, não saio de espetáculos no meio, mas foi isso que vi. A interpretação deste fato pode ser boa ou ruim. A sua foi a pior. Feliz semana do anônimo feliz pra você e obrigado pelo retorno sobre a resenha.

  7. Anonymous disse:

    A Veja é o nosso totem, tinha esquecido de dizer.
    Grande abraço Quina.

  8. Mariana disse:

    Olá…
    Ja vi essa peça uma vez. Nunca mais me esqueci dela. Mas não me esqueci pela, muito bem colocada “escatologia brutal (e mal contextualizada)” que você disse. A única coisa que me lembro é daquela cena, e nada da história ou das outras cenas. Se era essa a intenção, conseguiram passar a impressão.
    Sai do teatro enojada, e passei a ler com atenção e procurar as criticas antes de ir às peças.
    Infelizmente, sai do teatro com uma impressão negativa.

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