Dona Flor e Seus Dois Maridos

Críticas   |       |    7 de outubro de 2008    |    17 comentários

Marcelo F., 37 anos, pelado e prostituído

Foto: Divulgação

Ela tem entre 23 e 25 anos. É loira, o rosto redondo, cheio. A maquiagem está excessiva. Está na fila “F”, cadeira 23. Olha constantemente para trás. Falou pra si mesma: “Não é possível, o teatro cheio e não tem ninguém conhecido aqui”. Quando eu circulava a imensa fila que se fazia fora do Teatro Paulo Pontes, estava pensando a mesma coisa que a loira.

A minha chave de leitura para qualquer espetáculo teatral passa pelo elucidamento de duas perguntas: por que se montar esse texto e o que se dizer com o texto (entendamos texto, inclusive, com a ausência de). Encontrar tais respostas mostra pra mim que tipo de teatro se quer fazer e para quem se quer falar. E isso ficou muito claro quando eu vi Dona Flor e Seus Dois Maridos, direção de Pedro Vasconcelos, o Etevaldo de Fera Ferida, com (vou dizer exatamente como anuncia a voz que agradece aos patrocinadores e pede que a gente desligue os celulares) “Carol Castro, Marcelo Faria e grande elenco”.

Sem querer entrar no papo de essência, o Jorge Amado entendido pela direção foi o da superfície, da cor local, torcido em caricatura “macumba pra inglês ver” com cariocas no triste ofício de macaquear sotaque de baiano e apoio/promoção/apresentação de 28 empresas. O músico-ator imitando cada gesto/olhar/timbre/pausa de Dorival Caymmi foi quem melhor me definiu a proposta da peça. Tipo propaganda das havaianas.

Ele foi a metáfora do (grande) elenco.

João Pessoa é uma capital relativamente pequena. Se a gente pensar na “turma que vai pro teatro” dá pra identificar o povo que está sempre prestigiando companhias, palestras e espetáculos de referência na cidade. Havia poucos, dessa turma, aliás, só vi um, desfilando nas filas que davam voltas em frente ao Paulo Pontes. O termo é desfile mesmo. Aquele cheiro uniformizado de perfume do boticário. Homens ensacados usando camisas sociais – havia até um deputado estadual; mulheres com roupas da Riachuelo e C&A, bolsas grandes e prateadas, saltos; velhinhas com xales brilhosos; bombadões e suas respectivas gostosas.

Algumas pessoas estranharam a pressa de outras, “é cadeira numerada, não sei por que estão correndo”. Falta de costume talvez. No Paulo Pontes uma espécie de – tem uma pitada de exagero – “cultura artística” paraibano, só em espetáculos com a presença de estrelas e “grande elenco” os ingressos são numerados.

A moça que sentou do meu lado conseguiu trazer sua amiguinha da primeira fila pra sentar perto dela. A amiguinha tinha uns 20 e poucos, cabelos escorridos, cacheados e lavados há pouco tempo. Quando a voz que anuncia os patrocinadores disse, enfatizando cada sílaba “é terminantemente proibido fotografar”, ouvi um rabicho de conversa da amiguinha de cabelo molhado sobre Por uma Vida um Pouco Menos Ordinária, peça que se apresentou no Fenart com um Du Moscóvis dando um piti e se dirigindo a alguém na platéia ordenando que não o fotografasse mais.

A mocinha começava a conversar o t-e-m-p-o – t-o-d-o. Carol Castro entrou em cena e toda uma enxurrada de flashes. A mocinha, a de cabelo lavado, “véi, isso é muito foda”. Marcelo Faria beija Carol Castro; dá a primeira das muitas bolinadas, a platéia risca um assobio, a mocinha “povo matuto do carai, nã..”.

Só que tudo era motivo de: comentário, narração, adendo, história, conversa paralela. Eu me virei e disse: “se vocês continuarem conversando eu não tenho como assistir”. Marcelo Faria. Nu frontal. A platéia se arrepia. Ouço uma vó na fila de trás, dizendo algo como “ééééita (segundos depois) precisava disso?”

Na saída, sentadas em um banco, três moças comentam, serelepes. Estão na faixa dos 30 anos. Uma delas, alta, pulseiras, roupa preta, salto, calça jeans de marca. Esta daí saca o celular: “Mulher-er, tu tás aonde? Amanhã, você teeeeem que ir pro teatro. Minha filha, você vai ver, simplesmente, o Marcelo Faria nu-zi-nho”.

Ela foi a metáfora da platéia.

2 outras perguntas que não querem calar: quem é o júri do Prêmio Shell e quem é o oculista de Bárbara Heliodora.

'17 comentários para “Dona Flor e Seus Dois Maridos”'
  1. é acabei perdendo a peça, mas vejo que não perdi muita coisa. jorge amado é um grande escritor que continua sendo macaqueado pela mídia nacional. uma pena….

  2. Kiko Rieser disse:

    Devia pelo menos ser a Carol a ficar nua! Hehehe.

  3. Luana disse:

    Logo se vê que quem quer dar um de crítico de teatro, ficou tão impressionado e preso às pessoas que circulavam, como uma “MARIA” em beira de esquina, que não teve tempo de analisar a mensagem passada pela peça, que define de maneira perfeita a realidade de muitas mulheres, a dúvida entre o desejo e a tranquilidade.
    Claro que apresentada com um certo tom de comédia,porém creio eu, o livro não tenha sequer sido lido pelo ilustríssimo Astier Basílio, pois é exatamente isso que Jorge Amado passa em sua obra.
    E é realmente muito triste alguém que se acha tão competente como crítico, tratar um espetáculo como este resumindo-o apenas aos quase cinco minutos em que o Marcelo Faria fica nú, pois a peça tem duração de mais de uma hora e meia, e em somente quatro cenas curtas é que está presente a nudez do ator.

  4. astier basílio disse:

    Oi ilustríssima Lu,
    tudo bem?
    brigado pelo comentário.
    Olha, só , o que é “Maria em beira de esquina”?
    Nunca tinha ouvido essa expressão.
    Qto ao fato de eu ter lido ou não o livro, desculpa, Luana, eu não costumo falar sobre minha vida pessoal em público.
    E tem mais, na bilheteria não tinha ninguém pedindo currículo. Ou seja, venderam ingresso pra qm leu o romance, pra quem não leu e pra quem tava começando a ler.
    Eu acho que não me considero “tão competente como crítico”. Pelo menos não lembro de ter escrito isso aqui ou em qualquer lugar, Lu. Agora, confesso, eu sou competente cozinhando risoto de camarão. Cê tinha que provar.
    Qto ao resumir o espetáculo de uma hora e pouco, ao nu dos 5 minutos do Marcelo Faria, confesso, foi inveja. Eu queria muito era ver a Carol Castro pelada.
    Mas, legal que pra você o espetáculo “define de maneira perfeita a realidade de muitas mulheres” – a peça comunicou, falou pra vc e isso é o q importante, mais importante inclusive do q essa ou qlqr outra crítica. Beijo.

  5. Antony disse:

    Assisti a peça duas vezes no Rio de Janeiro, a sgunda ves foi porque tinha que levar uma amiga.(rs)
    A peça nao é das piores, mas realmente me fiz a mesma pergunta que vc se fez..
    Quem é o juri do premio shell ??????

  6. odenir disse:

    por favor a peça dona flor poderia sair em dvd mas sem corte ok espero por isso. ham mas uma coisa marcelo poderia sair na gmagazine por favor…….

  7. malu ingrid disse:

    oi
    gosto muito da peça!
    e queria saber onde posso encontrar as falas dos personagens, pois tenho que fazer uma peça de dona flor e seus dois maridos e ainda não encontrei nenhum roteiro!
    se puderem me ajudar ficarei grata!
    se der pode mandar para o meu email!
    beijoos
    Obrigada!

  8. Oi Malu Ingrid,
    vê só, acho difícil conseguir o que você quer.
    O máximo que você vai encontrar são aqueles resuminhos
    pra vestibular, que não é o q vc quer.
    Um roteiro com falas… ou vc pede direto à produção do espetáculo o email deles é esse:
    contato@donafloreseusdoismaridos.com.br

    ou vc vai ter que queimar as pestanas e ler as 397 páginas do livro. Mas, vale a pena ler, dependendo do tempo que vc tenha pra apresentar o trabalho. Se não, o lance é vc ver o filme do Bruno Barreto, que em toda locadora boa deve ter, e ficar copiando as falas. É uma né?
    Bom, você que sabe.

    Abração

  9. kaylane disse:

    Oi…
    Eu gostaria muito de ter o roteiro da peça ”Dona flor e seus dois maridos”
    Se puder me passar agradeço muito pois tenho uma montagem em para fazer e preciso.

    obrigada

  10. denise disse:

    GENTE ASSISTI A PEÇA EM RIBEIRÃO PRETO E FOI SIMPLESMENTE OOOTIMA, MARCELO E FERNANDA DERAM UM SHOW……………

  11. Marcelo disse:

    Sou totalmente a favor a livre expresão de comunicação. Mas fiquei constrangido com as cenas de nudez do ator Marcelo Faria. A maneira como foi exposta. Achei simplesmente apelativo. Não bastasse as cenas como desfilou no teatro mais de uma vez. Se quisesse ver cenas de nudez teria ido a um teatro de cenas explicita de nudez ( teatro porno ).Pelo menos saberia aonde estaria levando a minha família.
    Peço as autoridades e aos diretores de informar o conteudo nos cartazes em respeito ao povo Brasileiro.

  12. Lidiana graia ferreira disse:

    Amei a peça de vcs foi o maximo,a ferndinha tudo de bom,o marcelo faria nem se fala…
    Todos os atores meus parabens…

  13. jacira noberta da conceiçao disse:

    adorei apeça sou atriz e gostaria de apresentar-la como fasso para obter o texto? fiquei dislubrada com a historia parabeéns para todo o grupo eu ganhei um dvd de soane quando fui a ilheus ja asistir vaias vesia

  14. Ruy Mertens disse:

    Assisti a peça no Rio, e achei ótima, me diverti muito. Parabens a todo elenco.

  15. curioso disse:

    qual o tamanho do pênis dele? grande ou pequeno?deve ser uma maravilha!

  16. José disse:

    O texto de Jorge Amado não precisava de uma nudez completamente apelativa de um ator global para fazer sucesso. Fiquei triste com o apelo. Pior ainda a caricatura forçada que fizeram do comportamento das mulheres baianas. Moro na Bahia e não vejo nada daquilo pelas ruas. Muito mais exagerado do que “ó pai ó” e “cidade baixa” que já são caricatos, porém discretos. Uma peça que poderia ser brilhante, estragada por um apelo para chamar público. Já tinha um elenco global…precisava de nu apelativo?! Colocasse as cenas clássicas do vadinho envolto no jornal e a nudez de costas caminhando ao final…mas levantar da cama de frente com o penis balançando foi lamentável. Nada a ver!Ficou parecido com aquelas peças da Companhia de Patifaria (baiana) que fazem uma comédia toda caricata e, do nada, aperece um cara bonito nú…
    É descaso com a arte do nú… muito bem feitos em peças como a Alma Imoral (Baseada no texto do Rabino Bonder e o clássico Equus, onde a nudez é um detalhe que agrega e enaltece o espetáculo.

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