Marragoni

Críticas   |       |    6 de agosto de 2007    |    3 comentários

Ópera de Brecht vira teatro de rua

Deu trabalho encontrar informações sobre Marragoni, montagem que esteve em cartaz no Engenho Mostra um Pouco do que Gosta III até o domingo passado. Digo isso porque achei que assistiria As Bastianas (que perdi mais uma vez, novamente com uma semana de atraso), mas estava lá no Engenho um tal Núcleo Arruaça, formado este ano no Núcleo de Teatro de Rua da Escola Livre de Teatro de Santo André (é teatro até não acabar mais). Eu sou uma desgraça pra organização*.

Não, eu não me decepcionei. Pelo contrário, gostei muito de ver uma adaptação bastante livre da ópera Ascensão e queda da cidade de Mahagonny (foram infiéis até no título) de Bertolt Brecht, escrita na década de 20 e adaptada para as ruas do nosso país (gostaria de deixar claro que não sou nacionalista, pelo contrário, por mim liberava tudo, mas preciso ressaltar as barreiras que um grupo supera ao fazer uma tradução do alemão e ao imprimir na montagem uma característica muito própria: a rua).

Engenho de casa cheia, o grupo nos recebe fazendo cantoria na porta. Todos os personagens muuuuito caricatos e super empostados, sem qualquer perda, já que o espetáculo foi concebido para espaços públicos. É verdade que a lona do engenho é um atenuante que altera totalmente a obra, mesmo assim não faltaram surpresas por parte da platéia. Falo especificamente de um grupo de moleques que queriam de qualquer forma chamar atenção ao longo do espetáculo. Estavam na peça certa.

Todos os estereótipos passam pelo palco – o malandro, o muquirana, a puta, o juíz, o valentão – para explicar como funciona a cidade de Marragoni. A adaptação encontra nessa alegoria meios para fazer críticas à medíocridade da tv brasileira, à política, à mesquinhez das relações feitas somente por dinheiro, tudo isso numa chave cômica que parece ter sido escolhida sob medida para o evento onde foi apresentada. Mas sabemos que não foi.

O único ponto que ainda parece ser intransponível para obras de rua é a ingenuidade na abordagem de temas. Tenho a sensação de que todos os espetáculos de rua que vi até hoje abrem concessões demais para a compreensão de todos. Talvez seja tempo de encontrar (e aqui não digo que deve haver, mas é mais uma procura minha) montagens de rua que incorporem as dificuldades sem facilitar demais para o público. Mesmo com essa ressalva, o espetáculo guarda um final muito criativo para passar o chapéu e fazer do espectador cúmplice do que se passa no palco. Integrantes de outros grupos presentes ficaram com invejinha da solução, necessário dizer.

Na semana que vem a mostra do Engenho continua, e, aposto, vai seguir lotada. Se você quiser assistir O Cobrador, chegue com meia hora de antecedência, compre um pastel e aproveite pra economizar, porque as apresentações são de graça.

3 reais entre quitutes e doação na hora de passar o chapéu

'3 comentários para “Marragoni”'
  1. Cristiano disse:

    Salve Fabrício.

    Aqui é o Cristiano Gouveia, ator e diretor musical da peça Marragoni.

    Agraecemos pela crítica aqui no blog!

    Mas ´fiquei em dúvida sobre seu penúltimo parágrafo, onde vc fala sobre “concessões demais”, e “facilitar demais para o público”. Gostaria que você falasse mais sobre.

    Pode mandar um email pra cris_gouveia@hotmail.com

    grande abraço!

  2. Fabrício Muriana disse:

    Oi Cristiano

    O que eu quis dizer com isso (e realmente relendo acho que ficou pobre) é que falta um pouco mais de simbolismo no espetáculo. Acho que a escolha por encenar uma ópera do Brecht na rua é super criativa, mas acho que a encenação (apesar de nada naturalista, o que já é muito legal) não colocou mais questões, símbolos e cenas de múltiplos sentidos. Ficamos mais no sentido original da história, claro que transposto pra nossa realidade no Brasil (o que tb é bem legal), e vocês ainda fazem alguns paralelos, mas tudo muito direto. Ainda estou na procura de espetáculos de rua que se arrisquem mais nos silêncios, nas imagens sem sentido único e no simbólico. Mas isso é uma reflexão que fiz depois. Talvez o espetáculo de vocês já tenha isso e, pra mim, passou batido. De todas as formas, avise quando vocês forem se apresentar de novo pra eu tirar a dúvida e mande fotos pra gente publicar aqui (cheguei a entrar em contato com a Ana Roxo, mas ela não me enviou). Vamos discutindo. Abraço.

  3. Felipe disse:

    Fui apenas 1 vez para Ver Marragoni..
    E Gostei muito da Peça..

    E Esperamos que o Grupo possa ter mais paças maravilhosas como essa

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