Peter Pan – Todos Podemos Voar

Críticas   |       |    27 de agosto de 2007    |    14 comentários

Capitão Gancho Pop Star

Da Redação da Bacante. Colaborou o espírito Lucius.

O espetáculo começa já do lado de fora, no estacionamento. Em um mise-en-scene, o público é convidado a adentrar a Terra do Nunca a bordo de uma carruagem conduzida por pôneis (devidamente fantasiados). O cocheiro é o maestro, que na falta de uma orquestra ao vivo, movimenta a batuta conduzindo o playback grandioso que toma conta de todo o espaço. Em determinados momentos, em pausas quase brechtianas, pedem para os cavalos anões pararem e fazerem gracejos, para deleite da criançada presente. Aqui já fica um reparo: os pôneis são lentos e insuficientes, portanto, sugerimos chegar cedo, tipo duas horas de antecedência. Considerando que o Credicard Hall é longe pra caramba, vale levar um lanchinho.

O diretor argentino Ariel del Mastro afirma que essa espera é uma busca por uma forma mais brasileira de fazer o espetáculo. Vale lembrar que a obra foi originalmente produzida em Buenos Aires e agora faz temporada de frente pro esplendoroso Rio Pinheiros, importante marco da poluição paulista. Gosto de pensar no Rio Pinheiros. Ó Rio Pinheiro, Rio Pinheiros, tão perto da Vila Olímpia, tão longe do mar.

Enfim, voltando ao que interessa, há uma certa confusão na linguagem quando reparamos que o cheiro do dito rio se confunde com o cheiro do estrume dos pôneis. Nada que atrapalhe o brilhantismo dos primeiros minutos de atuação do entrosado grupo. Inclusive é pisando no mesmo estrume que entra o protagonista do espetáculo: Capitão Hook. Sim, vocês também pensaram que por ser Peter Pan, a peça seria calcada no personagem que nunca envelhece. Mas que surpresa temos ao encontrar uma releitura contemporânea tão lírica ao mesmo tempo política, ao comparar a falta de mão do capitão com a falta de dedo do nosso presidente. Não tinha como ter ficado mais brasileiro.

Com isso, a peça faz uma crítica ferrenha ao comunismo – sistema empregado por Peter Pan na Terra do Nunca, em que os meninos perdidos não precisam trabalhar e vivem atormentando a vida daqueles que realmente dão duro. Para radicalizar essa crítica, o espetáculo cobra ingressos de 50 a 150 reais. Capitão Gancho encontrou um filão mais lucrativo que saquear navios, hein?!

Devidamente acomodada nas confortáveis poltronas da sala de espetáculos, a platéia mal imagina que as surpresas da noite estão apenas começando. Surgem as crianças voadoras que nunca envelhecem, acompanhadas de uma espivetada (e seminua) fada Sininho que sobrevoa a platéia em vôos rasantes e burlescos, jogando seu famoso pó de pirlimpimpim (feito de glitter, não se enganem) sobre a platéia. Eis que, então, o subtítulo do espetáculo se concretiza: algumas poltronas da platéia começam a flutuar, para desespero de seus ocupantes. Deu dó da avózinha da terceira fileira, o mecanismo de sua cadeira emperrou no ar e ela teve de assistir o resto do espetáculo todo lá de cima.

Após a abertura da cortina a mágica realmente começa. Ou melhor, é o que a equipe da Bacante supõe, porque não estava lá para assistir. Calma, minha gente, pode botar o telefone no gancho (não no Capitão Gancho, no gancho do telefone mesmo), não é necessário ligar para o manicômio. Infelizmente a montagem em cartaz no Credicard Hall não deve ser tão questionadora assim. E a Bacante de fato não assistiu o espetáculo. “Então por quê diabos vocês escreveram isso tudo?”, vocês devem estar perguntando. Pois bem, a gente responde: ao contatarmos a assessoria de imprensa da CIE Brasil, mais especificamente uma moça chamada Luciana Stabile, fomos informados que a prioridade para os ingressos de imprensa eram para… quem já havia escrito sobre a peça.

“Mas precisamos ver a peça antes de escrever”, argumentamos, e recebemos a seca resposta “Não! Não precisam. A Folha e o Estado escreveram sem assistir!”. Uou, pegou pesado a mocinha. Como a gente ficou com medo da forma agressiva como ela nos tratou, aqui está o que ela pediu, um longo texto sobre a peça. Claro, escrevemos como deve ser feito: com base naquilo que assistimos (ou seja, nada). Talvez haja alguma discrepância na crítica, mas a gente não se responsabiliza.

Depois de tanta baboseira, vamos à parte séria deste texto (sim, na Bacante vez ou outra a gente escreve algo sério). Nessas horas, é bacana ver o quanto alguns assessores de imprensa são tão desconectados do universo em que trabalham, que se esquecem que o papel da crítica (seja esta qual for) não é a de fazer propaganda de graça em troca de ingressos, mas sim de analisar criticamente o espetáculo. A gente não fazia questão destes ingressos, e não está aqui pra escrever textos em troca de bananas, digo, convites. A gente está aqui pra analisar criticamente aquilo que achamos que vale ser analisado na cena paulistana. E olha só! Essa questão certamente é mais interessante pra gente do que ver o Leonardo Miggiorin voando por aí imitando o Robin Williams.

Valeu, Luciana.

4 bacantes junkies, cheirando pirlimpimpim

'14 comentários para “Peter Pan – Todos Podemos Voar”'
  1. Valmir Junior disse:

    Eu sou fã de vocês! Essa foi a melhor. Prêmio Evoé para a Bacante. Que venha o Pulitzer.

  2. Anonymous disse:

    Eu acho que se vcs querem fazer critica imparcial como deveria ser o jornalismo, não deveriam nem ligar para a assessoria de uma peça e pedir convites. Deveriam ir na bilheteria e comprar os ingressos. Isso sim seria jornalismo ético.

    Adriana Rodriges Alves

  3. Maurício Alcântara disse:

    Então, Adriana…

    Onde você está vendo imparcialidade aqui? A Bacante é assumidamente e orgulhosamente parcial. A gente fala bem do que a gente acha que mereça ser elogiado, e mal do que a gente acha que mereça ser criticado. É, “tipassim”, nossa premissa editorial número um. Imparcialidade a gente deixa por conta da Veja e do Jornal Nacional.

    Em momento algum o fato de pedirmos ingressos para assessoria enviesa algum tipo de opinião, isso nós garantimos. Acontece que se não fossem os ingressos de imprensa, não conseguiríamos cobrir metade do que cobrimos. Até porque é uma revista totalmente independente e sem nenhum fim lucrativo. Nós apenas fazemos uso de algo que é posto à disposição. O único compromisso que assumimos ao aceitar ou pedir convites é o de escrever o que achamos, com o máximo sinceridade.

    É mais ou menos assim: nós temos interesse em ver o máximo de espetáculos e dizer a nossos leitores o que achamos (e isso inclui elogiar e criticar). As assessorias e grupos têm interesse de divulgar seus projetos a quem possa eventualmente divulgá-los espontaneamente. A gente assiste e diz o que acha. Se o que a gente escrever for favorável, ótimo. Se for desfavorável, eles simplesmente ignoram e o texto, que fica como um registro para os leitores da Bacante (para quem o projeto da revista é destinado). Simples assim.

    Na verdade, a gente só pede ingresso de imprensa porque existe uma assessoria à disposição (exceto no caso citado neste texto, claro). Inclusive, é bastante comum a gente não conseguir convite, e muitas vezes, quando achamos que vale a pena (o que não é o caso de Peter Pan, vamos combinar), pagamos pelo ingresso sim. Vai da relevância de cada montagem para a revista.

    Agora, uma coisa que não dá pra aceitar é alguém pedir pra gente escrever sem assistir. Pior que isso: usar como argumento que os principais jornais do país supostamente o tenham feito, e que por isso, temos de fazer o mesmo para merecer as atenções da assessoria. É um absurdo muito grande e a gente não quer se vender por tão pouco.

    E uma última coisa: Estamos muito mais preocupados em sermos “blogueiros sinceros” do que “jornalistas éticos” (até porque nem todos somos jornalistas). É mais divertido e menos demagógico, sabe? E acho que é isso que mais vale a pena tanto pra gente como pra quem curte e acompanha a revista…

    Abraços.

  4. Leca Perrechil disse:

    Oi, Adriana

    Como já falamos tantas vezes no site, não existe crítica que seja totalmente imparcial. Essa é uma das maiores ilusões do jornalismo. Uma crítica necessariamente está calcada na visão de quem escreve, não tem como fugir. Além disso, uma coisa que esse site/grande blog não é, é jornalístico.

    O ponto principal desse texto acima não é reclamar ingressos não concedidos, mas a postura da assessora de imprensa, que foi extremamente grossa e argumentou que não precisávamos ver a peça para escrever sobre ela. Ok. Então isso é jornalismo ético? Escrever sobre algo que não vimos?

    Como o Maurício explicou, a revista não tem fins lucrativos, e não conseguiria bancar todas as peças vistas. Porém, acredito que jornalismo ético é escrever sobre a peça independente de fatores externos. Quer dizer que se ganhamos o ingresso iremos escrever bem sobre ela? Claro que não, só se a peça merecer.

    Ai também entra outras questões, como os preços abusivos das peças… convenhamos, cobrar 150 reais em uma peça? Isso é teatro feito apenas para a elite da elite… A rede sesc traz peças ótimas a preços populares, que muitas vezes bancamos nós mesmos…
    (mas essa não é a questão principal, aqui é só uma reflexão sobre o assunto… nem convém muito entrar nesse mérito).

    Abraços,

  5. Anonymous disse:

    Espero que depois disso a “mocinha da assessoria” vai pensar duas vezes antes de falar “qq coisa” p/ pessoas.
    Tudo bem que muita gente pensa que “assessoria” é pastelaria…mas alto lá!!!
    E cá pra nós…tem muito artista que faz questão de DAR ingressos para divulgar suas peças..seja critico renomado ou blogueiros e afins.
    Tem gente séria querendo trabalhar.

    abs
    Patricia Barbosa

  6. Emilliano disse:

    Nunca ri tanto de uma resenha!
    Eu tb quero q minha cadeira flutue!
    Deviam fazer mais resenhas de peças que não viram pra gente se divertir!

  7. Juli =) disse:

    Emiliano, concordo! Acho quee devemos fazer uma seção nova só pra isso! Só de resenhas de peças não vistas… ih, a gente tem uma pequena lista de ótimas possibilidades, viu!

    É, Patrícia, tem gente séria… e tem a Bacante, que não é séria, mas é sincera! E, olha, tem assessorias muito legais, que ajudam, facilitam… é assim que tem que ser pra ser bom pra todo mundo. Afinal, “assessorar” nos diz algo, não?

  8. gente, isso é surreal! mas não deixa de ser muito engraçado! hahahahahaha.

  9. Carlos Lima disse:

    Eu sou ex-funcionario da CIE brasil, empresa dona do Credicard hall e responsavel pela Peça Peter Pan.
    discordo plenamente da primeira resenha…
    pois eu assisti a peça e achei simplesmente fantastico…!
    claro que teve algumas mudanças…!
    mais nada que alterasse o valor e prestigio do espetáculo…!
    eu acho que a gente só pode flar dauilo que vimos..!

    e se vcs queriam mesmo assistir ao evento
    deveriam ter ido direto a tickemaster e comprado o ingresso
    e se tivesse pedido uma ajuda de custo pra Cie Brasil
    vcs poderiam ter comprado ingressos na suite-camarote(melhor lugar do credicard)

    auhaauhauhauhauhauhuh!!!!!

  10. Juli =) disse:

    Oi, Carlos.
    Concordamos plenamente com você: a gente só pode falar daquilo que vimos. É o que estávamos tentando dizer o tempo todo. Obrigada pelo reforço!

    Bjos,
    Juli =)

  11. A suíte-camarote tem cama redonda e espelho no teto?

  12. Leca Perrechil disse:

    O preço de um ingresso do Sesc + um ticket refeição + vale transporte equivale ao preço de um ingresso suíte-camarate com ajuda de custo?

  13. Eu achei tudo muito engraçado, mesmo. Desde a resposta da assessora (assessora quem? a imprensa?) até a resenha que escreveram sobre o ver-e-não-ver-escrevo-antes-ou-depois-?.
    Para quem é achincalhado aqui (devidamente ou não) resta o esperneio, para quem vem passear no site e ler sobre o meio teatral, é só risada, e da boa. Obrigada pela oportunidade! Beijos.

  14. milca disse:

    Eu amo o peter pan sou muito fã deleeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee

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