Santidade
Papa interfere na cena teatral em São Paulo
Em tempos de retomada do conservadorismo da Igreja Católica e da visita do Papa Bento XVI ao Brasil, não poderia haver melhor peça a ser encenada do que Santidade, de José Vicente, em cartaz no sempre polêmico Teatro Oficina.
Zé Celso e companhia embarcam de corpo (nu) e alma no choque entre a Igreja, com todos os seus dogmas, e o mundo contemporâneo – de liberdade sexual, aids, longas jornadas de trabalho, drogas e violência.
Com um texto atual (apesar de escrito há 40 anos), o espetáculo conta a história do casal gay formado pelo estilista de 70 anos Ivo (Zé Celso) e pelo jovem ex-seminarista Arthur (Haroldo Costa Ferrari). O conflito entre as crenças e a vida ostensiva de busca constante pelo prazer acontece quando o irmão de Arthur, o diácono Nicolau (Fransérgio Araújo), se hospeda na casa do estilista em ocasião da visita do Papa a São Paulo.
Dogmas antigos da Igreja Católica como a proibição do uso da camisinha e o preceito de que a relação homossexual é anti-natural, retomados com a nomeação de Bento XVI, têm sua praticidade questionada na peça. Como essas imposições podem ser aplicadas no mundo de hoje, com doenças sexualmente transmissÃveis e as drogas injetáveis ainda por ai?
Dirigida por Marcelo Drummond, o espetáculo traz toques pessoais do Teatro Oficina, como o trocadilho envolvendo Frei Caneca, rua famosa em São Paulo por ser considerada um reduto homossexual, e Frei Galvão, primeiro santo brasileiro canonizado por Bento XVI.
A atuação de Zé Celso é um espetáculo à parte, apesar de não ser a melhor da peça. Longe disso: Haroldo Ferrari e Fransérgio Araújo dão conta do recado e seguram o nÃvel da montagem. Contudo, Zé Celso nitidamente se diverte em cena, mesmo quando erra. Em um momento, quando precisa se vestir para sair de cena, quase coloca o paletó errado, mas conserta: “Esse não é o meu. Herchcovitch fez só pra mim, e eu não vou usar?”, fala se referindo a Alexandre Herchcovitch, estilista que fez o figurino da peça. Não é difÃcil compreender o equÃvoco: Zé não está acostumado a vestir roupas.
Ainda sem perder a piada, Zé aproveita mais uma vez para alfinetar a péssima qualidade da vizinhança. Tanto na peça quanto na vida real, o vizinho dele “topa tudo por dinheiro”.
O público do Teatro Oficina nunca ficou tão confortável como nesta montagem: pufes foram colocados em toda a pista para substituir o desconforto das duras arquibancadas do espaço. Uma das caracterÃsticas da companhia, a interação com a platéia aparece de forma muito amenizada. Os atores apenas passam no meio dos espectadores, jogam cuecas e, de vez em quando, dão uma sentadinha no colo de alguém. Nada demais pro jeito Oficina de ser. Mas como em toda platéia sempre há um perdido que não conhece esse tipo de teatro, a fala de um ator foi interrompida por uma mulher aflita que falava pra amiga, no pufe do lado: “Você me paga!!!”, enquanto Haroldo Costa Ferrari a abraçava por trás.
O único problema de Santidade é na utilização dos microfones pelos atores. No inÃcio da encenação, sem o aparelho, não dava para ouvir direito algumas falas. Quando começaram a usar, à s vezes, o microfone produzia ruÃdos de acordo com o movimento dos intérpretes. Em certas ocasiões parou de funcionar, mas não se sabe se propositadamente ou por causa de algum tipo de falha.
Pela segunda vez, o Oficina acerta ao montar um texto de José Vicente. Em 2003 encenaram O Assalto, com o mesmo diretor e também com Ferrari e Araújo no elenco.
Enquanto a Record proÃbe seus jornalistas de usarem o termo Santidade ao se referirem ao Papa, a Bacante aprova a peça e comprova nossa teoria: Zé Celso realmente nasceu pelado. Ele não consegue ficar vestido nem nos agradecimentos finais.
4 Papas de mingau
Acho interessante a quebra, uma desaforada crÃtica aos meios de comunicação de massa, aos ritos e crenças massificados. A peça mesmo tendo sido escrita em 1967 é muito atual, tapa na cara da hipocrisia social e sexual, porque não dizer?
Parabéns ao elenco do Santidade e odes ao autor José Vicente.
BelÃssima resenha!
Aplausos.
A forma como foi tratada a visita do Papa pela mÃdia já diz bastante disso!
Obrigada, Larissa.
Abraços.
leca do céu, este concerto com “c” (“coloca o paletó errado, mas concerta”). muda isso já. menina. é com “s”, de sapo. beijo.
Essa troca de S e C, além da Leca, passou por dois editores e uma colaboradora.
Comemos bola. Valeu a dica Ivam.
já sei o que é: o corretor de ortografia e gramática do ´word´ não acusou esse erro. não foi isso?! ai minha deusa! que medo de escrever agora! :S
Ai, ai, essas máquinas… Boa, Maria Clara, além da gente, passou pelo word! Então, pessoal, joga a culpa no word, que não pode se defender! rsss
Nossa Ivam, obrigada pela correção. Comemos bola: passou por 4 pessoas e um programa de computador e ninguém viu. E olha que sempre confiei no word!
Fica a vontade pra sempre que tiver um errinho, falar pra gente. Certamente erraremos mais vezes e sei que vc vai achar pra gente. Bjos.