São Paulo e Corinthians: A Comédia

Críticas   |       |    25 de março de 2008    |    11 comentários

Campanha pelos palmeirenses esquecidos…

Acompanhar o Fringe é como participar de um jogo de batalha naval: você atira pra todo lado e torce para acertar alguma coisa. Ao ler a sinopse do espetáculo, você já consegue ter algumas pistas sobre o possível alvo: um nome conhecido na direção do espetáculo pode indicar que um encouraçado passeia por aquelas águas; por outro lado, um texto e um título bizarros podem indicar que o seu tiro vai acertar mares nunca dantes navegados. O prêmio maior deste jogo é atirar no escuro e sentir toda a emoção de acertar um submarino que estava muito bem escondido.

De todos os espetáculos do Fringe a que assisti, nenhum me pareceu um tiro mais no escuro do que São Paulo e Corinthians: A Comédia. Resolvi assistir porque um aspecto despertou a minha curiosidade: este era um dos 14 espetáculos (sim, você não leu errado, são QUA-TOR-ZE mesmo) que o grupo Saltimbancos estava apresentando no Fringe. Durante o festival, os espetáculos são apresentados no próprio teatro do grupo, de segunda a segunda, em sessões a cada 3 horas, iniciando ao meio dia, e terminando à meia noite. Percebi também que o elenco das peças não era o mesmo e que uma escola de teatro funciona na sede do grupo, o que me fez imaginar (considerando o número de peças diferentes) que eu poderia estar perto de descobrir um novo celeiro do teatro brasileiro.

Confesso que não foi bem o que eu encontrei… O espetáculo conta com a participação de quatro atores (um casal vestido com a camisa do Corinthians e um casal vestido com a camisa do São Paulo) e é dividido em dois momentos. No primeiro, um foco ilumina o centro do palco e o hino do Corinthians é tocado, enquanto o casal corinthiano pula e dança freneticamente, na seqüência o mesmo ocorre com o hino do São Paulo e com o casal são-paulino. No segundo momento, a sofisticação é maior: o foco inicial se divide em dois focos menores, um pra cada casal, que passam a contar piadas sobre os dois times em um sofisticado esquema de revezamento – primeiro um casal, e depois o outro. O texto é muito elaborado, o que causa certa confusão nos atores, que repetem algumas piadas (talvez, não sei ao certo, esta repetição de piadas seja uma idéia proposital da direção, com o intuito de criar aquele sentimento de familiaridade com o objeto de riso, tão valioso nas comédias), comem algumas palavras e deixam o público perdido em muitas piadas.

Os assuntos tratados também são vastos: viadagem, homossexualismo e frescuras diversas no caso do são-paulinos e pobreza, malandragem e crimes diversos no caso dos corinthianos. As piadas se sucedem durante os 38 minutos da montagem, mas existe também espaço para mágicas e para poesias sobre a paixão pelos times.

O parecer final é o de que não assisti um espetáculo teatral. Não desta vez. Na realidade, tive a oportunidade de presenciar momentos muito mais teatrais em palcos curitibanos menos convencionais. Como exemplo: na madrugada anterior, em um restaurante italiano, fui surpreendido por gritos que vinham da cozinha, seguidos de palavrões e sons de pratos se espatifando. Freneticamente vasculhei o programa do Festival para tentar identificar qual peça do Fringe poderia estar sendo encenada ali… Seria mais uma releitura de Plínio Marcos? Uma peça grega? Que nada!! Descobri que toda a barulheira era proveniente de uma briga entre o dono do estabelecimento e o chef, que foi demitido por ter errado o ponto das sobremesas.

Fica inevitável então a comparação entre o incidente do restaurante e São Paulo e Corinthians: A Comédia. E o resultado é que o espetáculo dos Saltimbancos perde, pois o incidente do restaurante possuía atores melhores (excelente projeção de voz, grande domínio do texto e timing preciso), excelente iluminação, direção mais atuante, trilha incidental muito bem escolhida (fica difícil comparar Diana Krall com os hinos do Corinthians e do São Paulo, né?) e assentos extremamente confortáveis. E eu ainda saí do restaurante bem alimentado. Mesmo que sem sobremesa…

1 tiro na água (cercada de água por todos os lados)

'11 comentários para “São Paulo e Corinthians: A Comédia”'
  1. Valmir disse:

    O título do espetáculo denuncia bem o que você ia encontrar!

  2. Caetano disse:

    O famoso repertório teatral de Treat Serpa. Todo ano o diretor do grupo Saltimbancos bate recorde de peças inscritas no festival. Como o teatro também é deles, não há muito limite mesmo. Além de “São Paulo e Corinthians”, há ainda a versão paranaense, chamada “Atletiba: A Comédia”, sem contar as instigantes peças sobre relacionamentos e mentiras (todas com títulos auto explicativos).

  3. Marco Albuquerque disse:

    Pois é, Caetano, existe mesmo “Atletiba : A Comédia” e a Folha, em uma reportagem sobre o grupo, já noticiou que eles estão preparando uma peça sobre um clássico do futebol carioca.
    O lado bacana de tudo isso é que, no País do Futebol, cada estado tem o seu clássico, o que vai garantir material para pelo menos mais umas 20 montagens… E depois que este material se esgotar, é só mirar em outros assuntos: quem sabe, daqui a alguns anos, não estará em cartaz algo como: “Piadas de Pontinho: A Comédia”?
    É interessante também perceber que eles têm público e “reconhecimento”: andei passeando em comunidades do Orkut onde as pessoas apontam a melhor peça do Festival de Curitiba e existem indicações para as peças do grupo…

  4. Luana disse:

    Lamentável!!!! Deprimente!!!! Sofredor!!! Mas espero fla flu a comédia!!

  5. fernando disse:

    Eu como coxa q sou obviamente fui ver a peça “Atletiba”
    e “São Paulo e Corinthians” também.
    e ao contrário do que o comentarista escreveu, eu gostei e muito sim. a rivalidade entre as torcidas existe, e isso foi para o palco o q achei muita bacana, ainda mais q no final é passada uma mensagem de paz o q sabemos não existir entre a maioria dos torcedores.
    eu acho q o festival tem público para cada gosto.
    Então vamos respeitálo-los.

  6. treat disse:

    Caro amigo jornalista,
    logicamente nada agrada a todos, no entanto muitas pessoas que vieram ver essa peça gostaram, provavelmente por que também gostam de futebol.
    a simplicidade das cenas e direção foi algo proposital aliás o futebol é um esporte popular, e no mais o publico em geral não vai ao Teatro milindrando marcação de cena extravagânte nem pirotecnia. Obrigado por sua critica, mas não venha ver peças só no festival, visite nosso teatro durante o ano, ele é bem ativo pois tem público que paga ingresso, ri e aplaude. Fico feliz também pois Nelson Rodrigues disse: “A unanimidade é burra” Que bom que nem todos gostaram da peça.

  7. carlos jansson disse:

    Este papo de crítico esta esquisito. Uma crítica de egos e vaidades de quem tem preferências, não é próprio de transformações, que arrastam o cotidiano para o palco.

    Ninguém falou até agora sobre catarse de Goethe, Schiller, Rosseau. E mesmo de Aristóteles, que se não me engano, colocou que a partir dele nada era original.

    Me lembro que alguém falou sobre Capitu e Salomé. Será que a Capitu é aquele de Machado de Assis, e a Salomé é do Wilde ou do filme do Carlos Saura. Agora lembrei, ele é biblico.

    Querem criticar, pelo menos façam uma crítica descente. E não este palavriado chulo que só compromete a dignidade de um artista.

    Toda manifestação artística é valida e ninguém é deus aqui para ficar questionando valores.

    carlos jansson

  8. Fabrício disse:

    Discupae, mano.
    Num era as intenção nossa de comprometê a diguinidade de ninguém não. Na humildade mêmo, tá ligado?
    Manda um salve pro Schiller um abraço pros minino do Goethe.
    É nóis.

  9. Marco Albuquerque disse:

    Carlos! Uau!
    Fiquei muito emocionado ao ler o seu comentário! Como você escreve bonito e escreve difícil! Suas citações são ótimas! Infelizmente eu ainda não me sinto à altura para dialogar com você! Preciso estudar muito!
    O que eu sei, por enquanto, é que não gosto muito do Schiller, tanto que eu dormi no filme dele (“A Lista de Schiller”) porque não era colorido (eu achei que era problema da minha televisão velha, mas me disseram que o filme era assim mesmo…).
    Ahh!! Eu assisti a novela Salomé!! A Patrícia Pillar estava ótima e tinha até a Suzy Rêgo!! Não sabia que era baseada na Bíblia não…pensei que a novela era baseada em um romance do Menotti del Picchia… Me diz aí, quem é que fazia Jesus na novela? Sabe que eu nem reparei Nele?
    E tem certeza que foi o Aristóteles quem falou que “nada era original”? Eu sempre achei que tivesse sido o Sílvio Santos… vivendo e aprendendo..
    Cara, valeu pela aula de cultura! Obrigado mesmo! Abração!
    P.S. Quem é que interpretava Deus em Salomé, você sabe? Cara.. eu acho que eu não entendi aquela novela… muito descente de sua parte abrir os meus olhos para toda uma gama de interpretações…

  10. carlos jansson disse:

    Marco
    Tudo bem, Marco. Agradeço o elogio, embora tenha dúvida da sinceridade. Estou sempre aberto para novas amizades no meio, e que possa contribuir. E sempre pronto a uma crítica que se manifeste de forma salgada e irônica, e também em forma de elogio quando ela tem uma essência que produza efeitos positivos.
    Tenho uma característica forte para a ironia. Mas o tempo me fez ver que o outro lado leva a uma grandeza de espírito. Só quando provocado solto os cachorros, e eles gostam de comer carne sangrando.
    Alguns têm dificuldades para montar peças teatrais. Outros têm dificuldade para escrever críticas teatrais. E este não é meu caso.

    Abraço e obrigado.

  11. Marco Albuquerque disse:

    Carlos,
    Acho que posso falar pelos editores da Bacante quando digo que um dos maiores objetivos da Revista é o diálogo, seja com a obra, com o artista ou com o leitor.
    Claro que existe uma tendência que faz com que este diálogo seja sempre efetuado com humor (que eu particularmente adoro, foi o que me levou a ler e a colaborar com a Revista).
    De qualquer forma, o importante mesmo é o diálogo e portanto fica o agradecimento (sincero, pode ficar tranquilo) pela sua passagem e pela discussão levantada. Isso me (nos) faz pensar e aprender.
    Apareça sempre por aqui,
    Grande abraço,
    Marco

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