Vau da Sarapalha

Críticas   |       |    9 de setembro de 2008    |    1 comentários

Vau da crítica

Vau da Sarapalha fez curtíssima temporada na cidade de São Paulo. No mês em que o Palco Giratório trouxe de volta espetáculos mega legais como Adubo (para temporadas curtíssimas). O Vau, de que o Astier tanto nos comentava, fez só duas apresentações. Nós nos garantimos, compramos ingresso com mês de antecedência, mas como Jaiminho, gostaríamos de ter evitado a fadiga.

O fato é que nos bastidores, por trás do fabuloso mundinho da crítica, a vida de quem edita a Bacante é bem banal. Todo sábado temos ensaio e “contrapartida social”. Portanto, depois de um dia de trabalho, o que sobra de nosotros é no máximo um farrapo do que poderíamos ser. No dia de Vau, estávamos assim e lutávamos pra manter a atenção.

Nesses dias em que o corpo não ajuda, além de pensarmos em compartilhar a crítica – pela razão óbvia da impossibilidade de elaborá-la – também ocorre muitas vezes a vontade de rever em outro dia alguma coisa que nos tenha parecido muito promissora, que guarde alguma angústia que possamos reviver. E isso nos fez voltar ao Sesc Pompéia no domingo, segundo e último dia de apresentação, mesmo sem ingresso.

Há sempre uma história trágica relacionada ao dia em que não conseguimos ver uma peça. Não que a gente seja tão apaixonado por teatro que não consiga superar a perda de uma apresentação, mas o fato é que vez ou outra pinta aquela peça que você se obriga a rever e essa é mais triste de perder. Sobretudo quando isso acontece claramente por desorganização da instituição que recebe a peça, a mesma que reserva 20% ou mais dos ingressos a convidados que geralmente nem vão à peça e ainda prefere não fazer fila de espera organizada pra não te frustrar.

Quatro parágrafos de chororô à parte, ainda sobrou muito do Vau pra escrever. Mas é claro que eu teria que ler o conto. Adoro uma adaptação. As que desrespeitam o autor então, eu não perco. A peça Vau da Sarapalha deixa guardadas de maneira muito viva na memória as imagens de tudo aquilo que parece detalhe quando lemos o conto Sarapalha de Guimarães Rosa.

A sensação de repetição, de ciclo infinito, chega na primeira cena, em meio à infinidade de bichos, cujo sons são representados por somente cinco atores no palco. O tempo de blackout nos remete a esse lugar sem lugar. Onde só sobram algumas almas que nem parecem mais vivas. A malária não tem em Vau a mesma força que no conto. Mas a natureza opressivamente presente está na peça.

Não quero enrolar ninguém, achei Vau da Sarapalha um tanto textocêntrica, nada grave, pois há muito mais que o texto pra se prestar atenção na peça. O que certamente me roubou a atenção na maior parte do tempo foi a atriz que interpreta a preta velha. Um personagem tão sem referências no conto e tão presente pra revelar essa monotonia cíclica que é pano de fundo para a trama do conto. O cachorro complementa a cena, mas sabe quando se tem a sensação de já se viu muito cachorro no palco por aí? Talvez se tivesse visto a montagem há 10 anos… Nada de errado com o cachorro do Vau, mas minha atenção dispersava. Sempre voltava para a preta velha.

Toda vez que essa situação acontece, ou seja, quando vejo que houve uma pulsão criadora de um grupo, de um encenador, mas sobretudo de um ator no trabalho de montagem de uma adaptação, fico meio bobo imaginando a trajetória de descobertas que pode ser atuar. Uma trajetória que passa por completar lacunas e criar outras. Renovar o assombro com relação ao mundo e ao trabalho do artista. Foi isso que vi no trabalho dessa atriz em Vau da Sarapalha.

5 atores, só uma atriz realmente criticada

'1 comentário para “Vau da Sarapalha”'
  1. Ronaldo disse:

    A atriz ainda é a mesma fez “Central do Brasil”?

    Quando eu vi (há dez anos atrás) algo que me encantou muito eram os cheiros… O cheiro do café, da pinga, da hortelã (era hortelã?)…

    O cachorro também era mágico… mas já tinha visto muito cachorro por aí…

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