Closer

Críticas   |       |    3 de setembro de 2007    |    9 comentários

O texto é bom, mas isso eu já sabia.

Foto: João Caldas

O aroma das colônias, a indumentária selecionada e os comentários esvaziados não nos deixam esquecer: estamos no foyer do chiquérrimo e restaurado teatro Augusta, ali do lado do supermercado Dia e muito próximo das casas de meretrício desta conhecida rua de São Paulo. Assistiremos uma montagem naturalista de Closer, de Patrick Marber. Sim, é aquele texto do maravilhoso filme de Mike Nichols, que termina com aquela trilha brega “Can’t take my eyes of you…”. Originalmente publicado como peça de teatro, o texto de Marber pode ser visto na íntegra nesta montagem.

A peça, infelizmente, vale somente pelo texto, que é ao mesmo tempo o ponto mais alto e mais baixo do que se apresenta no palco. Patrick Marber conseguiu algo que deve fazer delirar platéias de palcos comerciais do mundo inteiro: uma dramaturgia que funciona super bem no cinema e no teatro. Pena que haja tanto respeito a ela quando se pensa numa montagem.

A frustração fica por conta de questões de linguagem mesmo. A tradução da atriz, produtora e tradutora Raquel Ripani deixa bastante a desejar e as deficiências desse trabalho ficam ainda mais evidentes por conta de uma forma meio corrida, truncada com que os atores encenam o texto. Vamos combinar que se a montagem já é naturalista, pelo menos que o mundo seja imitado direitinho. A marcação dos silêncios tinha que ter sido assinalada pela direção e faltou.

A iluminação reforça a semelhança com a “edição das cenas” do cinema e no todo somos levados a comparar a montagem do espetáculo com o filme que todo mundo conhece. É outra tristeza, afinal não estamos na sala escura com projeção e nem tem janela nenhuma pro mundo ali na frente – apesar deles terem usado as enormes janelas do teatro Augusta como parte do cenário, decisão bem acertada, por sinal.

O que reforça essa sensação de comparação contínua, além do naturalismo, é o programa do espetáculo . A Daniele Ávila já tinha avisado que escrever folhetos é normalmente mó mico. Nesse caso, resolveram colocar uma entrevista feita pela atriz, produtora e tradutora Raquel Ripani, com o autor Patrick Marber. A tal da entrevista é de uma superficialidade sem tamanho. Destaco alguns pontos especiais:

Você acredita em monogamia?
Na teoria, sim.

Quanto de honestidade é suportável num relacionamento?

Mais ou menos 75%.

Você ja ouviu falar do dramaturgo brasileiro Nelson Rodrigues, que dizia frases como “Se cada um conhecesse a intimidade sexual dos outros, ninguém cumprimentaria ninguém” e “O marido não deve ser o último a saber. O marido não deve saber nunca”?
Bravo!

E o Patrick dá a dica no final da entrevista:
“Eu odiaria se minha peça influenciasse demais alguém. É só uma história que eu escrevi. Nada mais, nada menos.”

Ok. Eu também não acho que o cara seja tão bonzinho assim (autores sempre cultivam um certo apego ao próprio texto), no entanto fica claro que a liberdade de releitura de alguma maneira estava dada. Mas é óbvio, investir na aquisição de direitos de montagem de um texto que foi sucesso em Hollywood é assumir que o valor da entrada vai bater a casa dos R$ 40,00. E será que o público pé-sujo dos teatros experimentais de São Paulo (tipo eu e você, sujinho leitor da Bacante) teria essa grana pra investir, com o DVD falsificado do filme vendendo baratinho ali na própria Augusta? Eu acho que não. Será que os atores que estavam no palco reverenciando o texto super bem resolvido de Marber se colocariam numa pesquisa teatral profunda, para trazer uma leitura realmente criativa do texto? Eu não sei, mas certamente traria resultados menos previsíveis.

Fica a sensação de uma montagem ingênua em vários pontos e uma vontade pessoal (afinal sou brasileiro e não desisto nunca) de procurar montagens deliberamente comerciais, mas que se proponham a fazer leituras mais ricas de textos que dêem margem a tal riqueza de sentidos. O Avarento, há bem poucos quateirões dali, conseguiu. Ok, citar Paulo Autran é apelar, mas ele consegue com 84 anos, porque não tentar pelo menos?

2 críticos no mesmo espetáculo. Um de verdade, outro nem tanto.

'9 comentários para “Closer”'
  1. Leonardo disse:

    Assisti à peça Closer, e fico com a sensação de que uma crítica é apenas e tão somente a opinião isolada de alguém.
    Adorei a montagem teatral. Saí pensando em meus relacionamentos. Me incomodou, e ainda me arrancou algumas gargalhadas.
    Mas vale uma ressalva: é uma peça totalmente Heterossexual.
    Talvez não atinja a compreensão de todos.
    Um abraço.
    Leonardo Pimenta

  2. Denis disse:

    Pelo começo da sua crítica, a gente já percebe que você estava num lugar onde não se sente bem, certo?
    Eu gostei de Closer, gosto do teatro Augusta reformado, e até o público que assistia o espetáculo, eu achei interesante.
    Além do aroma das colônias, senti na montagem, cheiro de sexo e traição!
    Achei a montagem criativa, de bom gosto (será que isso te incomoda muito?) e o elenco é muito bom!
    Como alguém faz uma crítica de teatro sem mencionar os atores???

    Denis

  3. Fabrício Muriana disse:

    Oi Leonardo.
    Concordo com você que a minha crítica é meramente a opinião de alguém. Acho que boa parte dos críticos que conheço não diria o mesmo, diriam que estamos mais preparados para analisar, que temos mais ferramental, enfim, isso, normalmente, é besteira. Só me arrisco a propor a minha, pq acho que tinha alguma coisa a dizer sobre essa montagem. Mas se tem algo que realmente valha a pena numa idéia de crítica na internet, é a opinião que vem de diversos pontos de vista, nesse contexto, o meu texto e o seu comentário têm o mesmo valor.
    Inclusive, desconfio que concordamos que a história suscita mais sentidos. Você comentou que a peça é totalmente heterossexual. Pois bem. Imagine o mesmo texto sendo relido a partir de uma perspectiva homosexual. Só por essa idéia simples, talvez a montagem já trouxesse muito mais riqueza ao espetáculo.

  4. Fabrício Muriana disse:

    Oi Denis
    Não, não acho que estava num lugar onde não me sentisse bem. Primeiro pq comecei a ver teatro assistindo peças comerciais com a minha família suburbana. Faço uma crítica que considero necessária ao público que freqüenta teatro como prólogo da pizza, pq a experiência do encontro, que só o teatro proporciona plenamente em todas as artes, fica muito entorpecida e distanciada quando esse público vai a uma peça para preencher tempo livre.
    Segundo, pq aquele é o meu caminho da roça. Passo na frente do teatro Augusta todos os dias, pelo menos uma vez. Gosto do fato dele ter sido reformado e continuar ali, num lugar complicado de se manter um teatro. No entanto, é impossível deixar de reparar que as montagens que por ali passam não dialogam em nada com a decadência da rua. Nesta peça, uma das personagens (Alice) trabalha como dançarina de strip tease. Olha a chance perdida de usar o espaço onde se apresenta como forma de diálogo, chance perdida de fazer paralelos.
    Sobre a parte do cheiro de sexo, eu não senti. Talvez pq tenha sentado numa fileira mais atrás. Enfim, não chegou. Na rua sim, voltando a pé pra casa, senti bastante cheiro de sexo e de prostituição. Mas aí não era nem naturalista, era de verdade.
    O fato da montagem ser “de bom gosto” não me incomoda, é simplesmente um ponto negativo que esqueci de citar.
    Por fim, sobre mencionar os atores, procura no google ae. É fácil. A galera vive publicando release na íntegra, você acha o nome dos atores rapidinho. Eu é que não vou ficar preocupado em citar cada um dos atores, senão pra criticar os Sertões eu ia ter que fazer uma página especial. É um preconceito bobo esse de criticar individualmente cada ator. Teatro se faz no jogo. Se alguém aparece mais, a coisa está complicada. Ao fim e ao cabo, colocar ou não o nome dos autores fica ao meu critério. Caso você ache que faltou, publicae nos comentários. Eles servem pra isso.
    Abraço.

  5. Juli =) disse:

    O doido é que, pelo que entendi, ninguém disse que a peça não provoca sensações, gargalhadas, etc… provoca, mas o problema é que provoca as mesmas sensações (ou muito parecidas) que quando vc vê o filme… teatro é mais… teatro tá vivo, tá num lugar…

    Outra coisa, vc quis dizer que a peça escapou da compreensão da Bacante porque é Heterosexual demais??? Oi?

  6. Anonymous disse:

    nao vi a peça mas achei a sua critica muito mau embasada e cheio de contradições e estou no anonimo pq nao to afim de briga, ate pq vc parece ser bem nevosinho, e cheio de ego em suas respostas aos comentarios.
    pena que uma revista tao legal como essa e repleta de boas criticas fica a merce desse tipo de profissional.

  7. Fabrício Muriana disse:

    Bem, anônimo, quando você assistir o espetáculo, nós conversamos.
    Grande abraço.

  8. Júlia Novaes disse:

    Assisti ao espetáculo. É de uma amiga minha, fico até triste em dizer que também não gostei muito. Sim, gostar é uma questão meramente pessoal, mas essa é a minha opinião pessoal. Achei que realmente faltou você cometar o trabalho dos atores, não os nomes deles, mas afinal, teatro são os atores, ali, dando a cara pra bater. E eu achei que essa foi a grande falta da peça. Gosto dos espaços serem os mesmos, sem seguir o jeito naturalista deles falarem, gosto de os amantes se darem as mãos enquanto a mulher briga com o marido, gosto das janelas serem as janelas do reformado teatro augusta. Não acho que a peça tenha obrigação de falar sobre a realidade a volta dela, não acho que o teatro estar na augusta faça qualquer referência a isso, muito menos na cena do strip, mas devo concordar que faltou sexo, faltou sensualidade, faltou uma menina, mas vivida, ali, tirando a roupa para um homem que ela conhece, por dinheiro. Me desagrada que tenha algum bom gosto nisso. Não deveria ter bom gosto. O começo do texto também me desagrada na tradução e no modo como ele é jogado fora. E apesar de tudo, acredito que bons atores tenham algo de errado quando os vejo encenar uma boa peça e penso no filme, ou em como preferi o filme. Fui pra gostar, não desgostei. Achei uma pena.

  9. Fabrício Muriana disse:

    Oi Júlia

    Super lúcido teu comentário. Acho que , ao abordar um teatro que tem moldes mais comerciais (mas que não podemos generalizar como um teatro comercial) infelizmente quase sempre caímos no gosto. Esse é o grande problema. Pois se a coisa for feita que alguém goste, aí já se perde muito e facilmente pode se cair em proselitismo.
    Foi realmente uma falta eu não ter comentado do trabalho dos atores. Digo aqui, a partir do que me lembro, que não mudou minha perspectiva de diálogo com o espetáculo. E acho também que os comentários estão aí pra isso. Pra que quem ache que faltou, coloque o seu ponto, como vc fez.
    Sobre o diálogo com o entorno, pode ser um exagero de expectativas minhas, mas é que o tema é tão absurdamente atravessado pela realidade que estava lá fora, que nãio consegui dissociar as coisas.
    Mesmo assim, ainda acho que tem excesso de expectativas minhas.
    Grande abraço e apareça sempre sem esse medo que atores tê de falar da obra alheia. É disso que precisamos mais por aqui.

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