Comunidad

Críticas   |       |    17 de setembro de 2007    |    6 comentários

Hermanos de saco, nada más

Fotos: Maurício Alcântara


Comunidad são seis caras de terno cinza, garbosos, enfileirados, olhando pra platéia no proscênio. Eles não são nada, até que começam a se entreolhar. Tudo começa nessa mirada, sempre demonstrando o ridículo dos gestos humanos. A peça vai esquentando, já estamos soltando gargalhadas e, não fosse pelo palco italiano, talvez nem reparássemos que a coisa toda é um espetáculo, de tão simples que é.

Os seis praticamente não usam palavras, e isso é um ponto altíssimo da adaptação. Esqueci de dizer no primeiro parágrafo, Comunidad também é um conto homônimo de Franz Kafka, de onde tudo começou. Neste conto, muito pouco se explica com palavras, por mais incrível que possa parecer. No palco, quando um dos seis solta uma única palavra, a platéia vem abaixo. Não são exatamente palhaços, mas podemos dizer que há muitíssimos paralelos com a montagem de Plan B, que esteve em cartaz no Sesc Pinheiros. Com a diferença que na montagem porteña o mínimo prevalece.

Em certo ponto, um dos seis é expulso da roda, pra não voltar mais. Ao tentar o retorno, é repudiado diversas vezes, sempre de uma maneira mais patética, o que reflete – no sentido de uma reflexão, e também no de uma reprodução – tanto [sobre] nossas ações cotidianas, quanto, vendo por um espectro mais amplo, [acerca d]a forma como grupos se organizam “corporativamente” em qualquer sociedade. Não há uma explicação para o grupo dos cinco não querer o sexto e isto é demonstrado no palco de todas as formas cômicas possíveis.

Atingindo aquele ponto sublime, em que uma obra tem sentido desde a sua casca até a gema molinha, Comunidad se mostra, junto com Espía una Mujer Que se Mata, um dos mais bem resolvidos espetáculos que assisti no Porto Alegre em Cena. Ambos argentinos.

5 +ou- 1 homem de terno cinza


PS:
Recomendo com veemência a leitura do conto curtíssimo de Kafka que linko aqui, para compreender a genialidade do grupo argentino na hora de adaptar. Essa versão está em espanhol, mas se alguém souber do link de uma em português, não se acanhe nos comentários.

'6 comentários para “Comunidad”'
  1. Daniele Avila disse:

    “desde a sua casca até a gema molinha”… o vc toma antes de escrever?
    desculpa, não resisti.

  2. Fabrício Muriana disse:

    É, vou ter que voltar com o Gardenal.

  3. Marcela disse:

    Linka nada 🙁

  4. Juli =) disse:

    Dani, a metáfora do ovo só não supera a do bolo… vc lembra da do bolo? Vou procurar, depois coloco o link… era ótima! rssss

    Má, vc não conseguiu abrir o link? Pra mim rolou…

    Beijos..

  5. Deca disse:

    Tive de ir pesquisar o texto para poder imaginar melhor a tal dinâmica do espetáculo,não resisti. Parece texto feito especialmente para inspirar “dramturgia”,génial.

    Encontrei, em português, neste link: http://paginas.terra.com.br/arte/ecandido/mestre41.htm

    beijos a todos!

  6. Fabrício Muriana disse:

    Po, que legal, Deca. Complementando o texto. Na época, não encontrei em português.
    Inspira uma dramaturgia, mas de cena, isso que acho demais da adaptação. Não há uma palavra. Mó vontade de ver mais coisas de Buenos Aires.
    Valeu pelo comentário e pelo link.
    Abração.

    Ps: Quando você vai escrever pra gente?

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