O CÃrculo de Giz Caucasiano
Como uma montagem de Brecht deveria ser?
O prólogo é projetado na forma de documentário, exibindo momentos de uma oficina que a Cia. do Latão realizou em acampamentos do MST. Neste vÃdeo, eles ensaiam um conflito entre os proprietários de um determinado pedaço de terra abandonado durante a guerra e aqueles que tomaram conta da região durante o perrengue.
O CÃrculo de Giz Caucasiano estabelece uma metáfora entre esta questão da posse da terra e a história de Miguel, um bebê filho de um governador assassinado durante uma revolta. Abandonado pela mãe, mais preocupada em salvar sua própria cabeça (e seus modelitos), é salvo por Grusha, uma empregada que põe sua própria vida em risco para cuidar da criança.
O espetáculo é tudo aquilo que eu imaginava que seria uma antológica montagem brechtiana. A direção é precisa e competente, todos os elementos postos em cena colaboram com a construção da narrativa, o grupo apresenta total afinidade com o texto e com a linha dramática de Brecht, e todos se agarram à proposta com seriedade e um forte engajamento romântico (ou seria romantismo engajado?).
Certamente o ponto mais alto é o elenco, impecável. Vale também mencionar a decisão mais que acertada de se usar uma música ao vivo e os atores cantando em coro, demonstrando uma excelente preparação vocal e a sensibilidade de não aproximar estes momentos do formato dos musicais em que a forma é mais importante do que o que é dito (ou melhor, cantado). A construção de cada personagem nos permite encontrar facilmente referenciais para personagens ou realidades tipicamente brasileiros – caso, por exemplo, do “corrupto-porém-justo” juiz Azdak, dos guardas que abusam do poder, entre muitos outros. Ou será que é o texto de Brecht que é universal?
Talvez a única ressalva que possa ser feita é no ritmo de condução do espetáculo. A impressão é de que a primeira parte da peça, que conta a trajetória de Grusha, se arrasta muito mais do que a segunda, em que ocorre o julgamento no qual é definido quem ficará com a guarda do menino Miguel (e quando ocorre a célebre prova do cÃrculo de giz, em que ambas as mães devem puxar o garoto, ao mesmo tempo, para fora de um cÃrculo). São duas horas de apresentação dos personagens e situações, para que o conflito se estabeleça (e se resolva, claro) apenas nos momentos finais. Tudo bem, o texto é assim, mas é aà que entra o papel do grupo de garantir que a primeira parte seja tão estimulante quanto a segunda.
Neste momento o leitor deve estar se perguntando onde estão as piadinhas (invariavelmente de mau gosto) deste texto. Pois é, eu também pergunto. A verdade é que é uma montagem tão, mas tão séria que fica até difÃcil de encontrar elementos de descontração para tornar o texto mais com a cara da Bacante. E isso definitivamente não é um problema quando a criação teatral tem a qualidade e a riqueza desta montagem. Só é uma pena que, apesar de ter tudo o que eu esperava de uma montagem antológica de Brecht, eu não tenha me surpreendido ou me empolgado especialmente com nada. Vai ver que é exatamente porque eu já esperava algo assim, mas um pouco de surpresa vai sempre bem, né?
3,5 horas de espetáculo
Vocês não teriam como disponibilizar a peça para download? Não consigo encontra-lá.
Meio difÃcil, Nayara.
Dá uma olhada nesse link. Tem uns precinhos bem baixos: http://www.estantevirtual.com.br/q/CIRCULO-DE-GIZ-CAUCASIANO