Paṿo Misterioso e Sacy Perer̻ Рa lenda da meia noite

Críticas   |       |    15 de julho de 2008    |    3 comentários

Olha o palhaço no meio da rua ou Cadê Sacy? ou Incomparáveis

Fotos Pavão: Maurício Alcântara
Fotos Sacy: Divulgação

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Além de mostrar inquietações que já estão transformadas em cena, um encontro entre artistas, público e pensadores de arte pode sugerir inquietações novas, questionamentos novos e, sobretudo, passos para além do que está ali consolidado. Nesta intenção, o FIT Rio Preto trouxe discussões sobre temas diversos, por exemplo, a dramaturgia contemporânea – alvo de debate ao mesmo tempo divertido e áspero entre Fernando Bonassi, Kil Abreu, Marici Salomão e Newton Moreno. Discutir dramaturgia, porém, é recorrente – não somente em festivais, mas também no cotidiano de grupos e espaços culturais. Um das questões sugeridas pelo FIT, por outro lado, me chamou a atenção pelo posicionamento diante de um tema menos freqüente: a classificação dos espetáculos destinados especialmente ao público infantil. O festival adotou para a programação de 2008, a nomenclatura “Para todos os públicos”, abraçando a idéia de que, ainda que tenha sido feito para crianças, um espetáculo pode tocar espectadores de qualquer idade.

Claro que eles não são os parteiros da idéia, nem dá pra dizer quem seja. Já ouvi mais de uma vez que as peças do Ilo Krugli, por exemplo, são entendidas de maneiras diferentes por adultos e crianças, mas conseguem ser repletas de significados para ambos. Efeito semelhante pode ser atribuído ao palhaço que, ao mesmo tempo, diverte a criança de maneira muito descompromissada e desperta emoções nos adultos, justamente porque traz, em si, uma visão de mundo ingênua, pura – e muitas vezes ridícula – com a qual o adulto raramente se depara. Talvez esta possibilidade de despertar o olhar para as lógicas mais simples da vida – esteja em cena um palhaço ou qualquer outro personagem – seja o que há de mais valioso nas produções infantis. Mas isso, claro, é só uma hipótese entre tantas e só um dos motivos entre tantos para que um produção destinada às crianças seja interessante para todos os públicos.

Para exemplificar um pouco essa idéia em Rio Preto, elegi dois espetáculos que trabalham com temas da cultura popular brasileira – um deles, tomando por base o folclore, Sacy Pererê – a lenda da meia-noite, outro a literatura de cordel, Pavão Misterioso. Aí você, leitor esperto e perspicaz, vai dizer: ah, então é isso! A cultura popular é que torna as montagens interessantes para adultos e crianças! E vai pensar que eu tô roubando no jogo porque escolhi duas peças muito parecidas. Aí vou ter que te dizer: Bobinho! Nada disso! Sacy e Pavão não têm (quase) nada a ver um com outro. Sendo assim, se quando você viu que eu ia escrever de duas peças, esperava uma comparação, peço desculpas, mas te enganei. E tudo bem se você se sentir ofendido e quiser parar de ler agora. Não há nada que eu possa fazer, as peças são incomparáveis.

Este ponto, aliás, é o que mais me interessa: a possibiliade que o festival traz de perceber como é possível pensar temas semelhantes de maneiras muito diversas, e que contribuem para a cena teatral cada uma a seu modo. Pavão traz dois palhaços pra rua para contar, debaixo de uma seringueira gigante (e quando eu digo gigante, é porque ela é gigante mesmo), a história de um rapaz que se apaixona por uma condessa grega. Mais do que a história e mais até do que os bonecos utilizados na contação (feitos pelos próprios atores), o que faz dessa peça uma obra para todos os públicos é a sua execução simples, espontânea, entregue, com tempos de diálogo muito sincronizados e olhar atento percebendo o público o tempo todo. E por simples, não entenda que o trabalho seja pouco elaborado ou exija pouco dos atores. Tome-se por base que os dois deram conta de uma praçona lotada no gogó, trocando de roupa, tocando violão, manipulando bonecos e tudo mais.

No caso de Sacy, o que dá destaque à montagem é a originalidade. E, mais uma vez, não tô dizendo que os caras inventaram a roda, o que fizeram foi valorizar e utilizar de maneira radicalizada um recurso pouco comum e bastante arriscado. Trata-se do teatro de sombra, mas o mérito não é só a escolha da técnica. Escolher, por exemplo, um cenário que não esconda a manipulação das figuras que produz as sombras é um risco corrido por quem acredita na história que está contando e no trabalho realizado, a ponto de abrir mão da magia que seria trazida pelo mistério e a curiosidade dos shows de mágica. Sacy não é um show da mágica das sombras, é uma maneira diferente de contar uma história que, aliás, é outra escolha arriscada, pois o Sacy destes artistas sulistas não é aquele negrinho arteiro, porém simpático do Sítio do Pica-Pau Amarelo, mas um monstrinho que, aproximado da luz fica bem amedrontador – nada que se compare ao Carmen Fúnebre, vale dizer, para onde algumas mães incautas também levaram suas crianças. O suspense da história e a magia do Sacy atraem as crianças, enquanto os adultos ficam boquiabertos diante da técnica, simples e sofisticada ao mesmo tempo, a serviço de lançar um novo olhar sobre uma história já tão familiar.

No primeiro caso, Pavão, pode-se comprovar a aceitação de crianças pelas suas gargalhadas – que parecem fáceis, mas vai você fazer uma peça e experimente deixar as crianças entediadas por cinco minutos pra ver se as gargalhadas não somem. O público adulto, no entanto, estava ainda mais facinado, haja vista o coro que se formava a cada música – que os pais conhecem melhor que seus filhos. Dá até pra falar da terceira idade, já que as velhinhas sentadas na praça, inicialmente constrangidas com o rebolado da palhacinha, não deixaram de sorrir e aplaudir de pé. No segundo caso, Sacy, o cinegrafista da WTN pode dar voz aos adultos, pois elogiou pelo menos umas cinco vezes a montagem aos seus criadores no fim do espetáculo (Aqui talvez haja outro tipo de identificação, já que um dos artistas admitiu ser um cineasta frustrado por conta dos baixos incentivos à produção de cinema e ter encontrado no teatro de sombras a realização do mesmo ímpeto que atraía para o cinema). No caso das crianças, mãozinhas levantadas cercavam os artistas no final, doidas pra perguntar como é que se fazia tudo aquilo, quando um garotinho, acompanhado da avó – “três aninhos só”, dizia ela, valorizando o muleque – afirmou com convicção, do meio do corredor: “Eu adorei assistir a esse pestáculo (…) E eu ri também”.

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5 Sacys fantasiados de Pavão pra poderem voar melhor

'3 comentários para “Pavão Misterioso e Sacy Pererê – a lenda da meia noite”'
  1. […] do grupo Forrobodó (É poesia popular), que também se apresentou no festival no ano passado com o Pavão Misterioso. O grupo Arte e Ciência no Palco apresentará dois trabalhos (Einstein e After Darwin), nenhum […]

  2. natalia disse:

    eu acho uma bobobajem o qui vcs fiseram

  3. Regina Florencio disse:

    Espetáculo maravilhoso!

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