Prêt-à -Porter 9
Prêt-à -porter-stage-book
Este texto dialoga com outra crÃtica feita para o projeto Prêt-à -Porter pelo MaurÃcio Alcântara. Aqui, ó.
Quando comecei a ter vontade de escrever crÃtica, achava que só ia querer escrever sobre coisas que valessem a pena. Até então, segui mais ou menos essa premissa: mesmo discordando, vendo problemas, das poucas peças sobre as quais escrevi, todas têm – pelo menos alguma – relevância. Este projeto termina aqui. Hoje resolvi escrever sobre algo que considero profundamente irrelevante: Prêt-à -porter 9. Vou tentar não escrever a mesma coisa que o MaurÃcio. Acabo de ler a resenha dele e penso: nem escrevi o negócio e o cara já está me copiando… Mas eu tenho umas questões a acrescentar.
Vi uma vez; não entendi a proposta e achei muito chato. Assisti várias outras coisas, depois cheguei a ficar longos meses sem ir ao teatro pra dar uma limpada nas minhas referências, enfim… quase dez anos se passaram e eu fui ver outro Prêt-à -porter, o 9. Não entendi a proposta e achei muito chato. O tÃtulo tem suas contradições e ainda entrega um pouco a falência da coisa. Pronto-para-usar? Primeiro: não está pronto, né? Pelo amor de Deus… Segundo: não dá pra usar pra nada. Mas dá pra considerar prêt-à -porter na medida em que tem cara de produção em massa. E o próprio termo, independentemente do seu significado, me remete a uma certa futilidade.
Na primeira cena, duas meninas, uma um pouco mais retardada que a outra (as personagens, não as atrizes), comem uma sopa que parece horrorosa fazendo movimentos espelhados. Na segunda cena, um garoto e uma garota conversam sentados em cadeiras; ela dança de vez em quando; eles bebem groselha feito loucos. Na terceira, um cara e uma garota conversam à mesa. Em todas, o texto não passa de um pretexto para os atores dizerem frases quaisquer. Não há dramaturgia: há um diálogo qualquer e um excesso de repetição para encher lingüiça. O estar em cena é sempre aquele meio de ladinho, falseado, os atores traçam uma diagonal e fingem estar de frente um pro outro. A fala é impregnada daquela dicção velha de aula de voz à la Glorinha Beutenmiller. É só.
Então, já que há pouco a dizer das cenas em si, vou falar do debate com os atores depois do espetáculo. Direto do túnel do tempo. Eles responderam (e não responderam) a questões propostas pela platéia. Qualquer semelhança com manuais do século XIX… Bom, perguntaram para uma menina como foi o processo de criação da personagem. Ela se empertigou na cadeira e disse: Nós vimos vários filmes, lemos muitos livros. Alguém perguntou: Que livros? Ela respondeu: Ah… vários livros… é…. hã… aqueles… como era mesmo? Ah! Lemos os livros do Arthur Miller: Trópico de Câncer, Trópico de Capricórnio. WOW! PERA LÃ! A menina é atriz, decora textos no dia-a-dia, leu dois livros de um mesmo autor e não conseguiu decorar o nome do sujeito?! Aà você pode dizer: Tadinha, ela se confundiu… Arthur Miller, Henry Miller, é muito parecido… Lamento, mas não dá pra confundir não. E os outros atores nem perceberam nada. Depois, eles foram falar sobre os filmes e, muito orgulhosos, disseram que o Antunes obriga esse pessoal a ver filme. Me pergunto se ele deixa comer pipoca. Até que, muito séria, ela disse: E nós fazemos laboratório. Realmente, é importante ir nestes debates porque a gente se atualiza. Não sei porquê, mas eu podia jurar que esse negócio de fazer laboratório era uma prática de algumas décadas atrás. Mas enfim… Eles não souberam responder nada que não pudesse ser encontrado em A preparação do ator ou coisa que o valha. Pior que as perguntas estúpidas (pergunta com enunciado elogioso tem que ser ignorada), foi a incrÃvel resposta que fechou a noite pra mim: O CPT é uma escola de vida, sabe?
O que eu quero acrescentar é o seguinte: a coisa toda me pareceu uma espécie de video-book no teatro. Vou batizar de stage-book. A peça não tem um fim em si. É uma espécie de desfile prolongado onde os candidatos ao estrelato exibem suas habilidades. E o ingresso pago é o cachê-teste deles. Por exemplo: Emerson Danesi mostra que sabe tocar violão e cantar em espanhol. Um fenômeno. Agora só falta atuar. MarÃlia Simões consegue colocar quatro ou cinco morangos dentro da boca de uma vez só. Marcos de Andrade explora muito bem a sua aparência esquisita, parece que acabou de sair de um filme do Tod Browning. Aliás, o personagem desse cara deve ser da famÃlia de D. Flávia. D. Flávia, não lembra? Da Dorotéia, do Nelson? Ele sente “a náusea”! E quanto a Simone Iliescu e Angélica di Paula?… bem… elas falam português! Não é genial? Do que será que eles estão falando quando enchem a boca pra dizer que são atores-criadores? Será porque eles desenvolveram um diálogo? Qualquer pessoa faz isso num curso de lÃngua estrangeira – e em uma lÃngua estrangeira!
O pior é que tem toda uma geração assim: sem muita perspectiva; querendo mostrar um trabalho não construÃdo; se masturbando com o ‘como’ mas cagando e andando para ‘o quê’. Eles querem ser atores, mas se você perguntar que tipo de teatro eles querem fazer, vão ficar olhando pra sua cara e depois perguntar: Como assim? Um monte de ator desesperado pra fazer teste, implorando pra ser encaixado nas idéias dos outros. Eu acho isso um problema grave. Prêt-à -porter tem essa cara: uma vitrine de manequins falantes. Se for pensar o que de fato é, diria que é algo sem cabeça, mas com dois pés: um no teatrinho; outro no teatrão.
OBS. Pra quem não tá lembrando do Tod Browning… em Os Sonhadores, do Bertolucci, aparece uns trechos de um filme dele – Os Monstros – com umas criaturas bizarras cantando One of us! One of us! She´s accepted! One of us!
0 momentos de reflexão e experimentação
A descontraÃda senhorita Daniele pensa que sim, mas obviamente não está preparada para ser crÃtica de teatro. Suas opiniões são infundadas e seu estilo me lembra as campanhas de conscientização da Mtv. Parabéns pela auto estima!
Não há dramaturgia? Que pena que há tanta gente que passa pelo bosque e só veja lenha pra fogueira. De todos os pret-a-porters que vi, este é o que apresenta, em termos dramatúrgicos, as mais preciosas peças poéticas.
Sempre ouvi dizer que a ignorância é atrevida, e é isso que sinto ao ler “esta crÃtica”.
Não sei porque os comentarios estão todos a favor desse mÃseravel peça que é Prêt-à -Porter, eles devem todos estar com medo de apanhar do Antunes …
Concordo contigo Daniele, é nada mais que um videobook sem o vÃdeo …