Mapeamento eternamente em constṳ̣o РBate-papo com Baịo de Dois

Bate-Papos   |       |    3 de novembro de 2009    |    0 comentários

Baião de Dois – Manaus – AM
Representante: Selma Bustamante

1. Financiamento: como o grupo financia seus trabalhos?

A nossa relação com o financiamento é diferente no sentido negativo. Porque nós não temos a Lei Municipal nem a Lei Estadual de fomento. Então existem alguns projetos, alguns programas que você pode colocar dentro da prefeitura do município, mas é uma coisa que não é nada certa e que não depende de você. Depende da curadoria e da verba que é designada, que é colocada. E também lá a maioria dos projetos são em relação a montagem, não existem projetos de circulação. E a circulação lá é muito cara, muito mais cara do que em outros estados. A distância é muito grande, não tem estrada ou é por rio. E se você fica muito distante do rio você tem que viajar de avião. É mais cara a circulação. Então, eu tenho me firmado bastante nos projetos da Funarte, que a gente dá sorte. Não conheço ninguém lá, não! Conseguimos ganhar quatro projetos de circulação, dois projetos do Myriam Muniz e agora ganhamos o terceiro projeto, que eles juntaram os dois e distribuíram em um projeto… O Myriam Muniz dá também circulação. Então nesse sentido da circulação pela região Norte o meu grupo circulou bastante e eu diria que foi totalmente financiado pela Funarte. E os projetos de montagem, além dos projetos da Funarte, com os projetos estaduais. Nossa grande briga é pela Lei. Porque nós não temos possibilidade nenhuma da Rouanet, não só porque a Rouanet é difícil pra grupos não conhecidos, mas porque lá nós estamos dentro de uma Zona Franca, onde não existe imposto e então não tem do que descontar. Então realmente pra gente dificulta e seria muito interessante a Lei Municipal e Estadual. As montagens do meu grupo são montagens pequenas então até a padaria da esquina, que me conhece, se pudessem financiar com parte do imposto deles seria suficiente para mim. É muito complicado, porque lá, inclusive, a gente não tem nem a possibilidade de cobrar bilheteria porque o Secretário ele compra os espetáculos e fornece de graça para a população. Então a população nem paga ingressos se a peça for de lá, só paga se a peça for de fora… Ela tá acostumada a ver peças de lá sempre gratuitas. Então eu vejo como muito difícil [o financiamento] de outra forma a não com a questão do edital, porque a gente não tem muito pra onde… A não ser o edital.

2. Diálogo com o entorno: como as questões da sua região estão presentes na obra do grupo e, por outro lado, como o grupo está presente nas questões de sua região?

Eu acredito que meu grupo – só tem eu que sou de fora o resto todo é de Manaus – então eu acredito que o trabalho que a gente faz é o trabalho de Manaus. Agora, eu fiz Molière. Eu fiz Molière porque ele é a própria Manaus, entendeu? As Preciosas Ridículas… Tem uma briga que ele coloca, sobre a Trupe dele em Versalhes, eu até falei “olha avisa depois que a gente tá usando Molière!”… Porque é muito parecido. Na verdade, a realidade não mudou. A realidade humana não mudou. Mudou a realidade técnica, mas o homem é muito igual. Então, nesse sentido eu acho que você reflete uma sociedade se você sabe onde você tá, conhece onde você tá e trabalha, apresenta onde você tá. Então a gente já fez trabalhos regionais, mas não trabalha só com trabalhos regionais. A gente fez o Auto do Boi, porque o Boi lá de Parintins ele ganhou toda essa repercussão, mas ele perdeu uma parte essencial que é a parte dramática. Eles fazem a festa, mas não fazem essa parte dramática. Então a gente refez isso daí é interessante porque as crianças não conhecem, os adultos se lembram… Então a gente trabalha também com coisas regionais, mas a gente faz uma linha mais do que a gente quer pensando sempre no que a gente tem, pra haver uma troca interessante. Eu acho que se você fizer um teatro que não fala da realidade você se mata né? Você tem que falar da realidade de uma certa maneira que você vê ela com a profundidade que você pode ter e com a troca que você pode ter com o seu publico. Eu faço um Beckett lá – que aliás fiz antes que ele viu? Do Sérgio Britto – é um Beckett, mas é um Beckett musgo é um Beckett com clown. Eu faço os dois atos do Ato Sem Palavras e ele fala do não-sentido da vida… E aí? Eu acho que é uma coisa que tá inerente ao homem. Eu, pessoalmente acho, pra todo mundo… Eu acho que o Beckett é maravilhoso, mas eu acho que o [teatro do] absurdo europeu é um absurdo do pós-guerra, a gente vive uma outra batalha, a gente vive numa rua com gente dormindo, que não sei o quê… Que é um absurdo também, só que eu acho que com muito menos você pode dizer a mesma coisa. Então, por exemplo, eu preferi o Beckett sem palavras, o ato I e o ato II sem Palavras porque eu acho que diz a mesma coisa em menos tempo e o público entende. Até criança entende. Eu acho que a própria criança tem a leitura dela dessa impossibilidade. Eu brinco que a importância que o grupo tem em Manaus é porque ele se mantém enquanto grupo mesmo, quer dizer, às vezes mudam algumas pessoas, mas ele tem uma característica de grupo, não é Companhia. A gente tenta resolver as coisas juntos, embora a gente não consiga… Acaba muita coisa com eu colocando, mas a gente vota, a gente se coloca, a gente tenta fazer uma coisa de grupo… Eu acho isso importante pra cidade. Porque a maioria da cidade trabalha muito com Cia. O cara é o dono e os outros fazem… Então é importante essa ideia do grupo. Eu acho que o grupo tem um papel de formação também, importante que as pessoas… Como a cidade não tem uma faculdade, não tem uma formação… O grupo tem esse papel de formação com aquelas pessoas que estão lá…

3. Fator agregador: qual o fator agregador/ definidor/ de união do grupo?

Eu acho que, sem falsa modéstia, eu acho que o que agrega o grupo sou eu, de uma certa forma. Porque sou uma pessoa que sou professora lá, que tive uma influência… Que nem você perguntar assim: por que as pessoas então no Ventoforte? Elas podem ter mil motivos, mas quem agrega o Ventoforte é o Ilo Krughi, não querendo me comparar com ele… Eu trabalhei com ele, mas… Eu digo assim, o que agrega o Oficina é o Zé Celso. Então independente de as pessoas procurarem uma ideologia que existe em comum no grupo… Nem todas elas percebem, dentro do meu grupo tem alguns que percebem a diferença que esse grupo tem de outros, e tem algumas pessoas que tão lá, mas elas não percebem naturalmente a diferença e aí eu não acho que é impositiva, eu acho que é uma coisa que você tem uma formação dentro do grupo pra que as pessoas percebam a diferença do grupo e queiram também segurar e se saírem pra outros lugares levarem isso na mente.

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