Próximo Ato 2009 – Segundo e Terceiro dias: A experiência com Eleonora Fabião

Blog   |       |    6 de novembro de 2009    |    0 comentários

Uma das novidades desta edição do Próximo Ato foi a idéia de unir os representantes do grupo em uma experiência orientada pela performer carioca Eleonora Fabião. Assim, em vez de encontrarem-se apenas para discussões e palestras, os grupos se encontraram também por meio de exercícios experiências menos racionais e mais relacionadas à sua prática cotidiana, diretamente ligada ao corpo, à sensibilidade e à criatividade.

Assim, utilizando, primeiro um espaço aberto, depois o porão do Centro Cultural São Paulo, 78 pessoas se encontraram e desenvolveram atividades voltadas à prática da performance, além de terem acesso a um panorama histórico curto, mas repleto de exemplos importantes de performers de todo o mundo.

O resultado foi um encontro mais potente e a possibilidade de esses artistas se conhecerem mais antes de darem início às discussões mais políticas que as próximas etapas do evento prometem. Outro resultado, menos importante, foi a performance realizada no vão livre do MASP à meia noite de ontem (5/11). A ação foi chamada pelos organizadores, a piori, de Vigília, mas até o momento não tem um título atribuído pelos próprios performers. A descrição dessa atividade inusitada, suas lanternas e seus (não) significados está muito clara no post do Paulo, aí em baixo. De todo modo, cabe ressaltar que a ação foi pensada coletivamente por 78 pessoas em menos de duas horas. As últimas definições foram feitas com os artistas sendo praticamente expulsos do porão do CCSP, pois era preciso preparar a próxima atividade que ocorreria no espaço.

Destaco isso, pois entendo que o improviso e, sobretudo, a data e horário reservados para a performance deixaram poucas alternativas de uma ação mais potente ou mesmo que pudesse se comunicar mais com a cidade. Primeiro porque não se sabia exatamente o que se queria comunicar. Depois, porque numa quinta-feira de chuva, à meia-noite, no MASP, não havia uma assistência muito diversificada. Paulo bem lembrou que, a qualquer dia e horário é possível pensar uma intervenção significativa – sobretudo numa cidade como São Paulo. No entanto, na minha opinião, isso requisitaria mais tempo de preparo e mais afinação de propósito entre os participantes – o que esperamos que possa acontecer, de alguma forma, até o final do evento. O mais importante de notar, como observadora-participante que estou sendo, é que a ação foi consciente de todas as fragilidades que Paulo aponta em seu texto, ou seja, o problemas foram identificados e, a partir disso, se definiu que a ação seria mesmo de celebração da possibilidade de um encontro nacional entre grupos para pensar seu próprio fazer artístico.

A atividade em si, descontado seu resultado “público”

“Fofíssima, eles vão limpar essa bagunça aí depois, né?” – me perguntou um pouco angustiada uma amiga que trabalha na limpeza do Centro Cultural São Paulo.

A bagunça era em função da primeira parte do encontro com Eleonora Fabião, em que os participantes tiveram a oportunidade de se conhecer melhor sem palavras – por meio de trocas de roupas, olhares e toques, além de outros materiais disponibilizados pela orientadora, tais como água, plásticos, tecidos etc. E eles recolheram tudo, para a alegria da minha amiga, que ainda estava impressionada com os nus que surgiam aqui e ali. “Isso é teatro, é?”, perguntava de tempos em tempos.

Eu, pensando que era comum ver isso em um espaço cultural, perguntei a ela se nunca tinha visto nada igual. “Ah, não, essas coisas acontecem só lá embaixo, nas salas fechadas… aqui eu nunca vi, não. Achei dá hora”.

Conto essa historinha porque houve algumas reclamações em função do local escolhido para o primeiro dia da experiência: uma sala fechada por vidros na parte superior e com barulhos diversos intervindo o tempo todo. Os artistas eram observados e muitas vezes eram incomodados por conversas, telefones, sons da sala ao lado. No entanto, para quem participava, era mais difícil notar a tranformação que sua simples presença naquele local podia provocar.

Esse primeiro momento de encontro e reconhecimento fica bem definido numa fala despretenciosa de Eleonora: “Olha só esse ai na sua frente! É o outro! Tem coisa mais gostosa que isso? Mais gostoso que isso só sorvete de baunilha”.

A proposta para o almoço já foi a primeira experiência de performance pública: os atores dividiram-se em duplas e um dava comida ao outro, sem que fosse permitido tocar na própria comida ou bebida. O que a princípio parece apenas romântico e engraçado, se revela uma experiência de cumplicidade e superação das dificuldades de convivência.

Na parte da tarde, os atores executaram enunciados de ações trazidos pela orientadora. Este ponto me pareceu o mais complicado da experiência, uma vez que, numa reunião entre coletivos, em vez de eles compartilharem suas formas de criação foi “imposto” a eles uma nova forma, completamente pronta, em que sua única função era a execução das ações. Essa impressão de contradição se amenizou quando percebi essa atividade como uma parte no processo de introdução à idéia de atividades performativas, pois no dia seguinte, os próprios grupos construíram os enunciados que executaram em seguida.

Finalmente, na parte da tarde, Eleonora leu um texto que trazia uma historização da performance, acompanhado de imagens de algumas peças reconhecidas em todo o mundo.

Todos os comentários dos artistas sobre a experiência foram muito positivos e ela de fato parece ter contribuído para aumentar a integração entre os participantes. No entanto, a mim continua parecendo que perdeu-se a oportunidade da troca de métodos de trabalho entre os coletivos. Isso, na minha visão de fora, foi a maior ausência. Em outras palavras, em vez de buscar um formato para misturar os muitos “jeitos de fazer” de pelos menos 30 0u 40 grupos diversos presentes ali, optou-se por padronizar um único modo de trabalho trazido de fora.

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