O Alienista

Críticas   |       |    15 de setembro de 2008    |    1 comentários

Depois da peça, a conversa

Manhã de segunda-feira, 15 de setembro de 2008. Ontem, assisti a adaptação da obra de Machado de Assis, O Alienista, apresentada pelo Grupo Dimenti, da Bahia, no Teatro Raquel de Queiroz, pelo Festival Nacional de Teatro de Guaramiranga. Hoje, foi dia de “debate” e, às nove da manhã – juro que acordei cedo – estava eu terminando o café às pressas pra poder chegar ao começo da conversa. Ontem, foi também dia de debate sobre Batata!, obra mais recente do Dimenti, livremente inspirada em Nelson Rodrigues e - de todos os relatos ouvidos sobre o encontro – concluo que “desceram o pau no grupo”.

Adentro a sala reservada ao debate no mosteiro da cidade e vejo uma estranha roda que faz lembrar os seminários de colégio. Há carteiras para sentarmos e o ambiente é professoral, centralizado na imagem dos três que ocupam a frente. Uma senhora de óculos a quem reconheço do cenacriticacontemporanea: Tânia Brandão, “teórica, crítica, ensaísta, professora” publicado no programa do festival assim mesmo, sem “e” nem “etc” no final das atribuições. Vejo também um homem alto e grisalho, que pela foto do mesmo programa verifico que é Sérgio Farias, “Ator e diretor teatral natural da Bahia” e professor da UFBA. O terceiro e último é um senhor de longos cabelos brancos amarrados, de nome Ricardo Guilherme, “ator, dramaturgo e diretor teatral”, “historiador”, “contista, cronista, poeta” e “jornalista”. Concluo que este último é a reencarnação de Leonardo Da Vinci, com um quê de mestre dos magos na cabeleira.

Começa o grupo, na figura de um garoto alto, cabelos e barba preta, que imagino ser Jorge Alencar. No espetáculo, ele assina a direção e adaptação. Sua fala dá conta de escolhas feitas pelo grupo no momento de adaptar O Alienista. Relata também que esse é o primeiro trabalho do grupo, de dez anos, e que quando foi apresentado pelas primeiras vezes, parte dos integrantes ainda estava no ensino médio.

Tânia Brandão tece comentários sobre o humor do grupo, mas logo chega ao ponto que parece ser o centro de sua fala: “não há Machado de Assis na adaptação”. Indica, inclusive, que o grupo não pegue a desculpa do Machado e vá pras suas próprias questões. Comenta, ainda, que as escolhas musicais tenderam a um senso comum e que há muito mais pra se trabalhar nesse aspecto.

A fala de Sérgio Farias é um tanto mais apaziguadora. O professor relata que vê um nexo em cada uma das escolhas do grupo e que há ali uma estranheza como quando se lê O Alienista. Acho que minha memória deu uma apagada geral no desenvolvimento de Sérgio, por conta da expriência por que passei na seqüência.

Começa a explanação de Ricardo Guilherme, que não poupa em nada o grupo. Primeiro diz que faz suas as palavras de Tânia Brandão e que, na peça, viu apenas uma cena que ele caracterizaria como adaptação do Alienista: aquela em que os atores fazem descrições de suas próprias vidas e são internados na Casa Verde. O resto, segunda ele, não teria nada de Machado.

O grupo rebate no final, dizendo que palavras como “cerne” e “essência” são palavras de que fogem no processo de criação. Dizem que apresentaram a peça pra um grupo de estudiosas de Machado de Assis e que essa discussão veio a tona. Deixam claro que cada uma delas têm uma leitura e enxergam um “cerne” diferente da obra de Machado de Assis.

Ricardo Guilherme pede novamente a fala pra dizer que ele tem “cabeça aberta” e que não é como as estudiosas de Machado que o grupo citou. Para deixar clara a razão de não se ver como tal, diz que dentro da peça a organização escolhida funciona, mas diz que a abordagem do Dimenti é “rala”. Ao cabo de sua fala, acende um cigarro e vai à janela.

As perguntas são abertas ao público e apenas uma pessoa se arrisca a questionar qual era a razão de um personagem permanecer em cena. Coisa banal. Segundos depois a pergunta está respondida e o “debate” está terminado.

1 possibilidade de diálogo crítico que se tornou normativo

'1 comentário para “O Alienista”'
  1. […] últimos debates foram em outro tom. Ricardo Guilherme deixou de ser o cara mal-humorado que eu desenhei na primeira crítica (mas, dizem, continuava indo aos debates com muito sono). Sérgio Faria fez considerações […]

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