O Arlecchino

Críticas   |       |    20 de maio de 2008    |    0 comentários

Um dia da máscara, outro do mascarado

Fotos: Elaine Ferreira

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Ai, como é gostoso lembrar o tempo em que a Rua da Consolação não tinha nem canteiro central e ainda nem era uma das principais conexões entre as vias da minha tão amada Paulicéia Desvairada. Naquele tempo, ninguém pensaria em construir um teatro ali no pé do cemitério da Consolação. Hoje, os fantasmas se escondem do barulho dos carros e o teatro chega em terras antes impensadas, de acústica por vezes duvidosa. Não bastasse o Fábrica São Paulo (que agora é Coletivo) do ladicá, agora temos o teatro Commune do ladilá, ambos com programações que se propõem a retomar – em menor ou maior grau – o teatro popular. Um com Fomento (muito dele) outro com Lei Rouanet (muito dela, captado na Petrobras).

No Commune, está em cartaz em palco italiano um espetáculo que é de rua, mas cabe no palco: O Arlecchino. Recriando a Commedia Dell’arte com todo o rigor da tradição – com algumas máscaras transformadas em pinturas – o espetáculo tem um forte apelo popular, e recria histórias por vezes escatológicas, por outras eróticas. Ah, como me lembrei de Dercy Gonçalves. Mas não a Dercy centenária que hoje é não mais que um rascunho daquela dercy cinqüentona, que tinha a platéia presa no canto de seu sorriso, à qual vimos uma vez eu, Sábato, Décio e Babi, em sessão especial para a crítica. A Dercy diva, que poucos tiveram a chance de fruir no palco. Mas Dercy nada tem a ver com Commedia Dell’arte, porque cheguei até ela? Ah! escatologia.

Voltando ao Arlecchino, tenho de relembrar Dario Fo. Sim, aquele do municipal. Aquele do prêmio Nobel. Aquele do solo em teatro comunista. Dario Fo é, como diz a geração das minha netas, tudo di bom. Tudo de retomada, de crítica. Dario Fo é o ser humano menos proselitista que passou por essas terras desde Nietzsche.

Mas aprendi que é papel do crítico julgar. Não há crítica nem coragem sem julgamento. E julgo que há um desnível declarado dos atores, ressaltado pela troca de Arlecchinos entre uma história e outra. É como se, contrastando com a segurança e domínio de palco do primeiro ator, o vigor da juventude tornasse precoces algumas das ações do jovem que interpreta o segundo Arlecchino. E para algumas coisas dessa vida ser precoce só atrapalha. Já diria Dario Fo a sua platéia ruborizada.

Se você não gosta que falem da sua potência na cama, da sua relação com buracos de fechadura, do quanto você é ou não liberal, da forma como você dá risada, enfim, se você não quer risco, passe direto na porta do Commune e vá sentar na última fileira de um stand-up comedy qualquer. Agora, se você quer saber o que é uma verdadeira peça de Commedia Dell’arte, este Arlecchino é obrigatório pra você.

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3 máscaras entre palco e crítica

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