Mostra de Repertório da Santa Estação Cia de Teatro

Críticas   |       |    10 de março de 2010    |    3 comentários

Uma não-crítica, escrita para o blog, publicada na seção errada de propósito

A Tempestade e os Mistérios da Ilha
Parada 400
Lipstick Station

Há um bom tempo estou esboçando a crítica para a mostra de repertório da Cia. Santa Estação, cujo trabalho eu havia conhecido em Porto Alegre em 2007 com A Tempestade e os Mistérios da Ilha, e que recentemente esteve em São Paulo para realizar uma temporada incluindo, além dessa peça, o musical Lipstick Station (em que os atores mostram mais “desarmados”, se divertindo), e a peça Parada 400: Convém Tirar os Sapatos (uma das montagens fundamentais da história da companhia e que revela não apenas angústias do grupo, como sua tendência à linguagem do teatro físico com gostinho de dança contemporânea).

A questão é: a temporada do grupo por aqui me deu mais vontade de pensar na temporada do que nas montagens propriamente ditas. Nada pessoal contra as montagens, não. É que a mostra realmente me levantou questões sobre o que significa, na cena teatral brasileira, “mostrar repertório” e prever “ser visto em São Paulo” como etapa de projeto (sobretudo na rúsvel, terra do buxixo do teatro). Isso sem contar questões pontuais (mas não por isso menores) que me ocorrerram, como “o quanto levar sua peça para um espaço estranho interfere no ‘acabamento’ da sua apresentação, e o quanto dessa interferência/distorção é aceitável/contornável desde que meu trabalho possa ser visto por novos públicos”. E aqui não me refiro só ao palco apertadinho dos Parlapas: dá pra estender a questão a qualquer palco de qualquer festival, situação que quase todos os grupos acabam enfrentando algum dia.

Mas ao desenvolver essa crítica, vi que era muito grande a possibilidade de eu estar sendo injusto ou impreciso nas análises por basear as coisas em suposições. E pior, levantando menos leituras potentes do que gostaria. Por isso, achei melhor registrar a temporada de forma menos analítica, menos voltada para os espetáculos em si, menos conclusiva – mas ainda assim tentando levantar algumas questões, ainda que sem saber onde elas vão terminar (conto com você, leitor interlocutor, pra pensar junto essas questões). Só não queria que essas questões esfriassem, porque podem ser interessantes pra começar a pensar nas condições em que o teatro é produzido e como ele circula em nosso país.

Outro objeto interessante para levantar leituras é o programa recebido na bilheteria dos Parlapas, que traz um material extremamente bem desenvolvido, com fotos, ilustrações, depoimentos. O que, num primeiro momento permite um contato maior com o histórico e todo o percurso do grupo (nada melhor para uma mostra de repertório, certo?), me faz pensar também no quanto aquele programa acaba mostrando para nós, público paulistano que não acompanha o grupo com toda sua obra e sua trajetória, apenas uma face editada, “apresentável” do grupo. Não, não estou supondo nada, nem desconfiando. Apenas pensando no quando qualquer mostra de repertório não permite contato com o todo, mas como um best of. Há muitos grupos cujos b-sides eu gostaria muito de conhecer. E muitos b-sides cujos artistas eu gostaria de conhecer para além dos releases e programas.

E a vontade de conhecer o grupo mais de perto, numa situação em que, menos do que “se mostrar”, o grupo surge, conquista seu espaço, estabelece suas raízes e seu contato com seu entorno, levanta um questionamento sobre sua formação, por ex-alunos de uma oficina com Jezebel De Carli que decidem dar continuidade às pesquisas em um grupo que inclui em sua formação a ex-tutora. Por, baseado em experiências próprias, desconfiar de possíveis relações de poder que minimizam a coletividade em situações como essa; e por estar plenamente ciente de que isso é uma encanação minha que, não só pode não ser fundamentada como, se for, é um problema do grupo e de mais ninguém, foi neste momento em que decidi não prosseguir com a crítica. Mas publicar os pensamentos anuviados em torno dessa temporada mesmo assim.

3 peças vistas, 1 texto torto

Confira as galerias de fotos das três montagens:

A Tempestade e os Mistérios da Ilha

Parada 400: Convém Tirar os Sapatos

Lipstick Station

Confira ainda a contribuição da companhia para o Mapeamento Eternamente em Construção iniciado no Próximo Ato, em 2009.

'3 comentários para “Mostra de Repertório da Santa Estação Cia de Teatro”'
  1. Gabriela disse:

    Olá Maurício!
    Primeiro, muito prazer, estive bem aí na tua terra, no palco dos parlapas, pena que não nos conhecemos, quem sabe poderíamos ter conversado mais sobre a Santa Estação, a trajetória do grupo, nossas angústias e alegrias também. As fotos ficaram lindas….e tenho certeza que o teu interlocutor ficou curioso para saber mais sobre os espetáculos. Eu fiquei! Se mostrar para outro público foi bem importante, surgiram propostas de patrocínio, convite pra Festival, voltamos em Março pra terra da garoa e lá no Memorial as pessoas vieram nos procurar pra conversar, pra saber e se conhecer e…. enfim! Grande Abraço…Gabriela

  2. Mau Alcântara disse:

    Oi Gabriela,

    Certamente haverão outras oportunidades pra batermos um papo pessoalmente, quem sabe tomar uma cerveja.

    Enquanto isso não rola, o espaço aqui também está aberto, pra quem se sentir à vontade.

    Abração
    Maurício

  3. Edgar disse:

    O Trabalho do Cia Santa Estação é fabuloso. E obviamente que o grupo faz uma mostra, como outro qualquer, e mostra seu melhor… em primeiro para o público. As dificuldades que circundam a cultura, estão em toda parte, especialmente em cidades que não estão no eixo de grandes patrocinadores como RJ e SP. Assisti, em Porto Alegre, aos dois primeiros trabalhos da Cia, e são trabalhos impecáveis, comoventes, doces e venenosos… sem duvida muito mais dignos do que diversos trabalhos mal acabados, pretenciosos e com patrocínios elevadíssimos, que assisti em SP e no RJ. Enfim, obviamente sem generalizar. De modo geral os grupos firmados em Porto Alegre, são muito cautelosos e profissionais, trabalham por amor a arte, já que a escassem de público e verbas públicas só existe… o teatro que se faz lá muitas vezes é para o colega da classe artística, e esse é bastante critico e exige, que exista um bom trabalho. Quanto a diretora Jezebel De Carli, já tive a honra de ser seu aluno, e essa mulher “dá sangue” para que tudo se sai o melhor possivel, e que todos envolvidos se divirtam, participem e colaborem com o trabalho. É um tesão trabalhar com ela, pois ela tira água de pedra. A Santa Estação tem muito o que apresentar pelo Brasil, para quebrar barreiras estaduais, mostrando que o Brasil, pode expandir e permitir sua arte de estar aqui ou ali…

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