5 Festival Mundial de Circo

Especial   |       |    17 de julho de 2009    |    6 comentários

5 Festival Mundial de Circo – Edição Ano da França no Brasil

“Para o público, o circo e seus espetáculos vêm preencher, no imaginário, a lacuna da liberdade. O picadeiro iluminado é o centro convergente desse impulso centrífugo do olhar e da atenção; local em que tudo, ou quase tudo, se realiza ou pode vir a realizar-se. O nomadismo que propicia o perambular por diversos lugares, sem se fixar em canto algum, fascina àqueles que se sentem aprisionados às amarras do cotidiano. O circo efetiva e realça o inconformismo da platéia para com seu dia a dia”, escreve Mário Fernando Bolognesi, no livro Palhaços, de 2003. Este trecho define uma aura conferida ao circo pelo público que, ao mesmo tempo em que encontra ecos na realidade – afinal, trata-se de uma atividade de movimento constante, muito diversa da rotina da que vive a maior parte dos trabalhadores – também pode acabar nos afastando de uma visão mais politizada e abrangente de uma atividade muito tradicional, mas com capacidade rara de renovação e troca com outras linguagens artísticas.

Falar em preservação de tradições e em trocas artísticas nos remete à necessidade de espaços-tempo capazes de aproximar determinada tradição de uma sociedade que nem sempre a valoriza (ou sequer a conhece profundamente) e, sobretudo, capazes de potencializar as trocas. Para o teatro – que, afinal, ainda é o foco dessa revista – há algumas alternativas bastante comuns: festivais, residências artísticas, trabalhos conjuntos entre coletivos, convite de grupos a diretores especializados em linhas diversas da do seu grupo, apropriação de outras linguagens artísticas, etc. Para o circo, não é muito diferente. E, nos dois casos, os esforços de interação e troca são mais intensos e mais abrangentes nos festivais, momentos capazes de reunir mais artistas e trupes e, dependendo do seu foco e organização, gerar debates éticos e estéticos que podem modificar os trabalhos dali por diante. Além disso, não se pode deixar de destacar a valorização pública que advém de grandes eventos – especialmente os internacionais – por vezes mobilizando cidades inteiras e despertando órgãos públicos e cidadãos para a importância do direito à cultura.

Há 5 anos, Belo Horizonte sedia um dos poucos festivais internacionais especificamente voltados ao circo. Este ano, a edição aconteceu de 19 a 28 de junho e contou com 8 espetáculos, 2 cabarés, 3 lançamentos de livros, oficinas com artistas do CNAC (Centro Nacional de Artes Circenses, a escola superior de circo da França), 4 exibições de filmes e 4 atividades do Projeto Diálogos, entre mesas-redondas e debates. Enquanto isso, na programação teatral da cidade o destaque era a peça Comi uma galinha e paguei o pato. Concorrência braba.

Fernanda Vidigal, organizadora do festival ao lado de Juliana Sevaybricker, conta que os festivais dedicados ao circo são recentes na história do Brasil, ainda raros e que, em geral, os artistas e espetáculos circenses conseguem inserir-se em programações de festivais de teatro, cujo circuito é mais forte. “Se dependesse de festivais exclusivamente circenses, o circo não teria o circuito ampliado”, afirma. Fernanda, inclusive, considera-se “filha” do FIT BH, festival internacional de teatro bienal que, segundo ela, é transformador para a cidade e para os artistas, oferecendo referências, movimento e motivação. Ela acrescenta, no entanto, que promover festivais só é possível a partir de uma demanda real, ou seja, que o festival não é um fim em si, mas uma conseqüência de uma produção nacional – e mesmo regional – com volume e qualidade.

CircoS – uma breve explicação sobre o uso do S

Como estamos mais acostumados a falar de teatro por aqui, cabe trazer para a discussão algumas questões específicas do circo. O que me parece mais importante evidenciar conceitualmente é a idéia de diversidade. O “maior espetáculo da Terra” é o lugar da diversidade, por essência e excelência. Mesmo nas discussões relativas à sua origem – uma possível associação de disputas esportivas em circos gregos com a preocupação com o desempenho performático – está presente sempre a reunião de muitos elementos (esporte, coreografia, música, cenografia, etc.) e a possibilidade de formatos diversos.

É importante que fique claro que esta diversidade não está colocada aqui num sentido cronológico (tipo “mudando com o tempo”, sabe?), nem muito menos “evolutivo”. Não tem Darwin! A questão aqui é uma sobreposição de influências que não são unicamente temporais, mas, sobretudo, culturais, próprias da origem daquela manifestação circense específica. Além disso, com o nomadismo não só de muitas companhias, mas também de muitos artistas, números se misturam, migram, se modificam, se complementam e o resultado é sempre mistura e uma diversidade que merece ser respeitada por ser característica essencial – diversidade dentro de cada espetáculo e entre os circos.

Assim, há circos com e sem lona; com e sem animais; fixos e itinerantes; grandes, médios e pequenos; familiares e frutos da ligação entre profissionais autônomos; que contratam com carteira assinada e que contratam informalmente; empresariais ou com foco em pesquisa e subsídio estatal; completamente legalizados e com inúmeros problemas contábeis e legais. E, além destas classificações objetivas e concretas, há classificações subjetivas que estão ligadas à percepção e à sensibilidade diante das especificidades culturais dos artistas que fazem parte daquele circo e do histórico do próprio circo.

Ok, bacana, isso parece óbvio. É, parece. No entanto, como é muito comum encontrar evolucionistas por aí, inclusive em mesas de debate muito interessantes, é preciso estar sempre prevenido, né? Porque alguém sempre pode dizer, com toda seriedade e – aqui assumo o risco – até sem más intenções, que o circo brasileiro está numa fase anterior à que a França viveu em 1978(!), quando a política cultural da França para o circo se alterou completamente. Mas, o circo brasileiro não quer, nem precisa ser o circo francês e não há um caminho evolutivo único em que a França pioneira colocou plaquetinhas de sinalização. Há processos históricos complexos e eu, que não sou especialista, não posso afirmar, mas a Bacante me permite chutar que em minúsculos circos itinerantes brasileiros deve haver números muitíssimo mais interessantes em muitos aspectos do que os das pequenas companhias de circo novo que se super-especializam no estudo das técnicas. Então, vamos com calma.

Fernanda Vidigal é bastante clara neste aspecto ao afirmar que “somos herdeiros dos europeus, mas o contato dos circos europeus com outras culturas também os levou a reinventar elementos e concepções”. Ela exemplifica que durante o século XVI muitos circos levavam apresentações de capoeira, por exemplo, de modo a evidenciar que o circo está em permanente diálogo com toda a produção artística e cultural pela qual passa. “É uma linguagem universal, mas ao mesmo tempo singular e específica”. O diretor francês Stéphane Simonin, responsável pelo Hors Le Murs – Centro Nacional de Pesquisas da França, concorda e acrescenta: “A força do circo pode vir da colaboração internacional, da sua capacidade de circular, de se confrontar com outras culturas e aprender com isso”, durante sua fala na mesa-redonda “Desafios para a construção de uma política pública para o circo”.

Diante disso, alguém pode querer usar o espaço de comentários aí embaixo para dizer: “ah, mas isso que se falou de 1978 é em termos de organização”. Bom palpite. Mas ainda que em termos de organização, é preciso apontar que, diferentemente do que se pode pensar, nem tudo na França é “o Estado forte subsidiando a galera toda”. Pelo contrário, posso concluir pelo que ouvi de fontes “oficiais”, que está em curso na Europa uma espécie de empurrãozinho estatal conduzindo a produção para o tal do “novo circo”.

Como assim? Imagine que, na França, segundo Stéphane Simonin, há um processo de “renovação do circo”, de modo que já existem 400 companhias de circo novo para 200 de circo tradicional. Politicamente, as companhias de circo tradicional, consideradas empresas comerciais e originadas geralmente na tradição de famílias circenses, são autoproduções que, sendo comerciais, não precisam e não recebem subsídios do governo. Por outro lado, as companhias de novo circo, consideradas empresas sem fins lucrativos e originadas geralmente nas escolas superiores de circo, vendem os espetáculos a intermediários que assumem os riscos de produção e divulgação, mas, nesse caso, como é pesquisa, recebem uma ajudinha do governo, destinada principalmente às companhias consideradas mais inovadoras por uma comissão especializada. Desse modo, cria-se facilidades para pesquisar as técnicas circenses em companhias cada vez menores (muitas vezes com somente dois artistas) em detrimento da preservação dos circos tradicionais, o que talvez explique a opção dos circenses mais jovens por montar suas próprias companhias.

Só para acrescentar uma informação, que prefiro deixar pra você, leitor, interpretar, o representante do Ministério da Cultura e da Comunicação da França, Jean-Michel Guy (todo francês chama Guy ou só a maioria?), um senhor com cara de francês presente em uma das mesas, nos contou que o novo circo vem num contexto de “orgulho nacional” e é um modelo para “exportação”. Meu francês não permite certificar se ele disse isso exatamente com essas palavras, mas a tradução simultânea disse. E sem ruído.

E aí, é bom ser uma novata no meio de um monte de gente que entende do assunto pra poder perguntar: “mas o que há de novo no novo circo?”. Segure a dúvida, falaremos disso novamente mais adiante.

Ano da França no Brasil

cnac-6

Foto: Divulgação

Para mudar um pouquinho de assunto, vamos falar da crise mundial. Tá, desculpa, esse assunto já te cansou, né? Vou ser breve: a crise quase impediu a realização da quinta edição do Festival Mundial de Circo de Belo Horizonte. No entanto, eis que se cruzam a intenção de trazer artistas franceses para o Brasil, sobretudo os do CNAC (Centro Nacional das Artes do Circo) por ser referência em ensino superior de circo, e o Ano da França no Brasil. Uau. A partir daí, portas se abrem para a produção do festival (inclusive as portas de comissões públicas para liberação de verbas) e o evento fica centrado principalmente na troca com o circo francês, mas sem deixar de contemplar escolas da América Latina numa luta conjunta pela regulamentação do ensino de circo que, segundo Fernanda Vidigal, não tem reconhecimento ou regulamentação dos Ministérios da Educação dos países latinoamericanos.

No entanto, a discussão sobre o circo francês foi a que mais esteve presente nos debates, com participação de representantes franceses em duas mesas, uma sobre políticas públicas, outra sobre organização da produção circense. Considerando que inclusive no site do Festival o circo francês é tomado como referência, cabe resumir aqui o histórico apresentado pelo ministro da cultura da França.

Para começar, o moço nos diz que uma política pública para o circo não pode se limitar a um apoio do poder público, ele deve ser apenas um dos atores. Ele afirma também que a ausência de política já é uma política, com que os brasileiros se identificam. Sim, no nosso caso não há política e isso significa, sim, descaso e falta de reconhecimento da tradição.

Até 1978, a França também não tinha política pública específica para o circo. A partir de então, ele passou a estar ligado ao Ministério da Cultura, pois até então estava sob responsabilidade de vários ministérios, mas sem o que ele chama de tutela ministerial. Em 1981, o Ministério da Cultura passa a ter uma visão de todo cultural. Para o circo, especificamente, isso se efetiva com a criação de uma linha orçamentária para apoiar a criação artística e um fundo que, naquele momento, contemplava 30 circos (15 de circo tradicional, 15 de novo circo) e cujo dinheiro era em parte público, em parte advindo do próprio faturamento dos circos. Também é criado o Circo Nacional, que dura apenas 4 anos e o CNAC – escola superior de circo muito celebrada no contexto do festival como modelo para outros países.

Para tudo isso, a justificativa do Estado não era meramente a das dificuldades econômicas que o circo enfrentava, mas a do orgulho nacional, a da criação de um modelo para exportação e a da manutenção da tradição da França como um “Estado mecenas” que sempre valorizou as artes. A partir daí, passaram a se formar artistas que, segundo o Ministro, não queriam mais trabalhar para as companhias tradicionais e optavam por criar suas próprias companhias, procurando a modernização da linguagem circense.

Então, traçado este histórico, o Ministro chega ao hoje e – desculpem retomar esse tema chato, mas lá vamos nós – a crise volta à pauta. “É difícil criar sem apoio público. Talvez cheguem a outras formas, mas atualmente depende-se muito do dinheiro público e há cada vez menos dinheiro”. Acontece, então, um desequilíbrio ente oferta e demanda de apoio público. Para o Ministro, a crise desincentiva os artistas a assumir riscos e, portanto, prejudica a inventividade (opa! A criatividade depende tanto assim de dinheiro?) e, talvez, neste caso, uma solução possível seja a redução das escolas ou a fusão entre elas. Contraditório? Magina!

O diretor Stéphane Simonin é um pouco mais abrangente em sua avaliação sobre o crescimento do circo na França. Para ele, houve três fenômenos fundamentais, sendo o primeiro a multiplicação de companhias de circo novo; o segundo a volta do circo às salas de teatro e às ruas, reduzindo o uso da lona; e o terceiro a prática amadora de circo, feita por lazer em cerca de 600 espaços oficialmente registrados na França. Para ele, isso representou uma democratização da prática e da técnica. “Até os anos 1970, só as crianças de famílias circenses tinham acesso a esse aprendizado, isso se ampliou graças à ousadia das escolas de circo”.

Nesse ponto, Fernanda Vidigal é mais direta em afirmar que está aí o que talvez caracterize pontualmente o novo circo, pois, segundo ela, a sinergia entre as artes já existia, o que há de novo, efetivamente, são pessoas de fora da tradição circense tendo a oportunidade de fazer circo. “Então, os novos sujeitos históricos envolvidos na tradição mudam a organização do trabalho nesta área”. (A discussão sobre novo circo também passou pela Bacante há tempos, nos comentário da crítica de Plan B) e no texto sobre La Fin des Terres.

Por sua vez, Simonin defende que a renovação foi uma ruptura estética importante para a modernização do circo e seu reconhecimento, mas que não é um movimento contrário à tradição circense e sim complementar. “Sempre pode haver uma parte com base mais acadêmica e outra mais folclórica”. O diretor chega a afirmar que “quando houver no circo brasileiro a abertura para outras artes”, ele também terá conseqüências positivas, incluindo entre elas outras fontes de difusão. Em sua fala, Fernanda contesta esta sugestão, afirmando que a maior parte das companhias já tem essa abertura à sinergia em sua essência e que, no Brasil, os problemas estão mais ligados a três outros fatores: falta de reconhecimento simbólico da atividade circense; defasagem na formação dos profissionais; dificuldades de financiamento (e aqui ela faz questão de citar a reforma na Lei Rouanet como uma possibilidade de avanço que nos atinge a todos em qualquer linguagem artística).

No resumo da fala de Simonin, cujo centro de pesquisa é responsável por um recenseamento que divulga um guia dos circos a cada 3 anos, ele conclui que as ferramentas na França que contribuem para o desenvolvimento do novo circo são: escolas, festivais, espaços de difusão, espaços de residência artística e subsídios governamentais.

Na outra ponta, durante as discussões da mesa-redonda “As formas de organização da produção da linguagem circense na contemporaneidade” fica a sugestão de que talvez os circos tradicionais franceses continuem completamente desamparados. Talvez por não fazerem parte do “modelo francês de exportação”, de modo que não são “orgulho nacional”. Com isso, de maneira muito semelhante ao circo tradicional brasileiro, há muitas companhias ilegais e passando por dificuldades financeiras, entre outras.

No Brasil, conforme depoimento de circenses, os problemas dos circos tradicionais – já que nós não implementamos um “novo circo” – estão principalmente relacionados à legalização da contratação de profissionais e à verba. O acordo de “15 dias” – tempo que os artistas e donos de circo se davam como “aviso prévio” quando um ou outro queriam romper o contrato – e a bilheteria não são mais válidos. Wladimir Spernega, do Circo Beto Carrero (sim, o do chicotinho), conta que, como o circo em que trabalha tornou-se grande e conhecido, começaram a aparecer muito processos trabalhistas. Logo, optaram por registrar todos os mais de 100 profissionais envolvidos. No entanto, isso é bastante raro no Brasil, não por falta de vontade, mas principalmente por conta do hábito e dos altos custos envolvidos, considerando que a responsabilidade administrativa não é, geralmente, assumida por um profissional da área contábil, mas pelos próprios artistas.

Além desta problemática bem típica da idéia de espetáculo mambembe, podemos destrinchar a questão da verba. Por um lado, comercialmente, é muito difícil para os circos pagarem suas despesas com a bilheteria. Por outro, os editais públicos ainda são limitados e o acesso dos circenses a eles é complicado. Neste ponto, porém, há que se considerar alguns avanços que se devem principalmente à atuação da Funarte – com uma área exclusivamente dedicada ao circo com três (uau!) funcionários para pensar políticas para o circo do país inteiro. Benefícios públicos, como o Prêmio Carequinha e outro especificamente para ceder lonas novas a circos de lona de todo o Brasil, procuram ajudar a preservar os circos tradicionais, porém esbarram na dificuldade de boa parte dos circenses em saber dos editais e se inscrever neles, tanto por conta das exigências, quanto por ser necessário estar legalizado – situação não muito comum. Para tentar resolver o problema da escrita dos projetos, por exemplo, o edital que cedeu lonas aceitou inscrições em vídeo, procurando facilitar a vida dos circenses.

Outra opção, os financiamentos e patrocínios privados são cada vez mais raros. Não somente por desinteresse das empresas, mas por questões dos próprios circenses, conforme afirmam Waldimir, Ermínia Silva, historiadora e pesquisadora dedicada ao circo e Marcos Teixeira, coordenador de circo da Funarte. Isso porque já houve, por exemplo, um financiamento público que não foi pago posteriormente por nenhum circo beneficiado, abalando a confiança para repetir esse tipo de iniciativa. Por outro lado, por não haver previsão de datas e locais de apresentação, há poucas garantias para empresas patrocinadoras, que acabam investindo sua verba em produções mais “estáveis”.

Outra dificuldade bastante presente está mais relacionada à itinerância. Como não há uma regulamentação padronizada entre municípios, os circos precisam realizar inúmeros processos burocráticos diferentes para que possam se estabelecer legalmente em cada cidade que visitam. Para complicar, há municípios muito resistentes à chegada do circo, novamente por “culpa” dos próprios circenses, já que o comportamento inadequado de um circo (como, por exemplo, deixar sujo o local que lhe foi cedido pela prefeitura ou não cumprir a temporada completa, entre outros) prejudica os próximos circos que passarem por aquela cidade.

Como solução para a maioria dos problemas dos circenses, a maior parte dos debatedores e mediadores do Festival Mundial de Circo 2009 apontam a união política dos circenses e a importância de todos se conhecerem. Nesse sentido, há duas possibilidades complementares. Uma delas é uma necessidade ainda não atendida – a definição de um órgão responsável por recensear a atividade circense em todo o país (Segundo Marcos, a Funarte já está em contato com o IBGE para providenciar um censo, mas acredita-se a princípio que haja de 500 a 2500 circos tradicionais). A outra possibilidade é uma inovação que independe de crise financeira: um canal de troca, interação, contato, intervenção política, chamado Circomunicando.

Circomunicando – construindo redes na rede

Criado por Joelma Costa (a palhaça Disparadinha) e administrado por ela junto à Associação de Famílias e Artistas Circenses (ASFACI), o Circomunicando é um fórum na Internet que discute assuntos do circo, disponibiliza documentos, formulários, divulga iniciativas importantes, esclarece dúvidas, estabelece trocas diversas e, com tudo isso, se tornou um valioso instrumento para a mobilização de artistas circenses e o contato mais intenso entre eles.

Em breve entrevista, Marcos Teixeira, da Funarte, conta dois casos de influência direta no Circomunicando em decisões macro políticas que envolviam o circo. (Leia aqui) Wladimir, do Circo Beto Carrero, enaltece: “Foi a salvação do circo”. Ermínia Silva esclarece que o fórum tem importância também por ajudar a superar a distância física entre os circenses e, assim, ganha repercussão por todo o país. “O Circomunicando é o responsável pela participação de militância de circenses em todo o Brasil”.

Foi a militância que levou Alice Viveiro de Castro a ser escolhida para representar o circo no Conselho Nacional de Política Cultural. Ela afirma que cidadãos unidos em classe têm muito poder e que é preciso marcar uma posição política clara. “É posição política, por exemplo, estar inscrito no Circomunicando, é uma rede de troca de informações e esse é o nosso papel”.

Ela defende, ainda, a integração entre os “tradicionais” e os “contemporâneos” e conta de diversas reivindicações defendidas no Conselho e fora dele, como a questão da proibição de animais nos circos. Para os circenses, não é caso de proibição, mas de regulamentação para que não haja maus tratos. “Por que pode haver animais no rodeio e no circo não?”. Muitos circenses, neste Festival representados na fala de Alice, argumentam, ainda, que o alvo da fiscalização são sempre animais raros e muito caros que são apreendidos sem critério e acabam ficando gratuitamente com outras instituições, ainda que não se comprove qualquer comportamento irregular por parte dos circenses.

A defesa de uma regulamentação para o uso de animais é só um dos muitos temas discutidos no Circomunicando. Alice foi quem incluiu, por exemplo, a programação do Festival Mundial de Circo no Fórum. Além disso, é por lá que muitos circenses ficam sabendo sobre os avanços da criação de uma política de Estado única para todas as áreas da cultura.

Políticas Públicas – a mesma questão, só que um pouco diferente

c2a9andrefossatimesas-8_bx

Foto: André Fossati

Em qualquer área, artistas enfrentam dificuldades para lidar com o financiamento público, mas têm inegável necessidade dele. Isso porque a arte dificilmente consegue sustentar-se sozinha e os patrocínios são sempre muito seletivos – ou seja, quanto mais global você for, mais dinheiro que você não precisaria é destinado aos seus trabalhos. Então, como a arte travestida de modelo de negócio não costuma funcionar, o jeito é recorrer ao financiamento público, defendendo o direito constitucional de todo cidadão à cultura. A partir daí, surge a necessidade de se definir critérios transparentes para lidar com o dinheiro público destinado à cultura, o que, de maneira geral, não acontece.

A maioria das ações governamentais acaba sendo episódica e parte do poder executivo, o que a torna mais frágil, uma vez que fica vinculada às disputas partidárias. A proposta do Conselho Nacional de Política Cultural é a de criar uma política pública de Estado para a cultura, ou seja, além de ser um sistema único – comparado por Alice ao SUS na saúde – que contempla todas as artes e todo o país, a política deverá conter diretrizes construídas pelo legislativo em conjunto com a sociedade organizada para orientar as ações do executivo de maneira permanente, independentemente de gestão ou partido.

O caminho está sendo trilhado, lentamente como exige a construção minuciosa de um projeto dessa dimensão, com a formação de um colegiado composto por representantes de todas as áreas e considerando as demandas municipal, estadual regional e federal.

Em entrevista para a Bacante, Marcos Teixeira, da Funarte, conta um pouco mais sobre o desenvolvimento desse sistema nacional de políticas culturais (leia aqui), mas continuamos ansiosos por prazos e, mais do que isso, continuamos vivendo a contradição de destinarmos mais dinheiro público aos departamentos de marketing das grandes corporações (via Lei Rouanet) do que para o Fundo Nacional de Cultura.

**

Vejas também as entrevistas com Marcos Teixeira, coordenador de circo da Funarte e com Fernanda Vidigal, coordenadora do 5 Festival Mundial de Circo.

'6 comentários para “5 Festival Mundial de Circo”'
  1. O tom poetico das primeiras linhas dessa materia suavemente cede espaco para as questoes politicas que a comunidade circense esta garimpando bravamente. Uma luta rescente mas que ja gerou resultados e despertou um novo olhar para o circo no cenario politico nacional.
    Obrigado pela aula sobre esse assunto e Muito Obrigado pelo espaco que a Bacante abre ao circo com essa materia.

    Ricardo Rodrigues

  2. Juliene Codognotto disse:

    A poesia ficou por conta do Bolognesi. O livro dele ̩ bem legal Рsuuuper acad̻mico em alguns momentos, suuuper po̩tico em outros.

    Sim! O espaço está aberto! Vamos ver como fazemos para preenchê-lo bem… de todas as formas, é muito bom conhecer mais esse “mundo”.

    Beijo,
    Juli =)

  3. […] Em BH, tanto no FIT quanto no Festival de Circo, eu não seria nada sem os parques centrais. Também conheci a casa de shows com o teto mais baixo […]

  4. Théteo Costa disse:

    Gostei muito do descompromisso desproposital da matéria com as técnicas que fazem o jornalismo engessado e menos suscetível a recursos literários. A estrutura ficou muito boa, e o Lead que não trouxe informação óbvias, curiosamente fez com que o texto não se tornasse cansativo.

  5. Juli disse:

    Olá, Théteo. Dizer que esse texto gigantesco não ficou cansativo foi um elogio inacreditável. Andam dizendo na Bacante que eu te contratei pra escrever isso…

    De todo modo, obrigada pelo comentário. Uma curiosidade: vc é jornalista, é?

    Beijoca,
    Juli =)

    PS: Te pago por boleto ou depósito em conta?

  6. josivan disse:

    quero escrever o meu cico nesse concurco

O que você acha?

A Bacante é Creative Commons. Alguns direitos reservados. Movida a Wordpress.